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segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Homens, Mulheres e "Crianças" no "pálido ponto azul"



Nessa sociedade em que vamos quase todos mais ou menos enredados pela Internet nos lares, escolas, ruas, e também incapazes de compreendermos o que se passa além de um palmo de nossos narizes, o filme retrata cenas do cotidiano e interesses dos personagens em uma comunidade norte-americana - homens, mulheres e crianças - entre seus desejos, sonhos não realizados e decepções na "sociedade de consumo" e das mídias digitais.

Parece-me que, de imediato, quase ninguém consegue perceber o que realmente se passa no interior do outro (e muito mal na vida cotidiana de ser criança e aluno), seja na vida em família, na escola ou nos outros cenários de nossas relações humanas, na "Vida Real" como se diz no filme.

Os dramas vão se desenvolvendo e provocando ações e reações a estimularem os personagens a tomarem suas decisões.

Ressalto da incapacidade daqueles que se fizeram de pais ou professores (des-orientados) a orientarem as crianças, sem absolutamente querer realmente saber, ou como des-cobrir que se passa na mente e coração de seus filhos/alunos. Até que pelas ações das próprias crianças é que parecem conseguir refletir alguma coisa, e entrar em "comunicação" com elas e seus pares adultos.

E, na escola, quem é que como professor consegue ajudar as crianças a lidarem com suas interrogações, para aquém ou além das tarefas inadiáveis do ensinar/aprender?

Pais e professores, lares e escolas colaboram (ou não) para a formação do caráter das crianças?

Imersos no mundo do mercado, e daquilo que nos é imposto para o consumo, nós nos consumimos entre dores e amores, esquecendo das possibilidades de apenas nos doarmos mais ao próximo...

E, no meio dessa vastidão do espaço com todas as suas possibilidades de manifestação da vida, quem somos nós com nossos pequenos, insignificantes ou grandes problemas e dramas, a vivermos nesse único "lar" que conhecemos - o planeta Terra - retratado como um pequeno e "pálido ponto azul" pela sonda Voyager? O "poema" de Carl Sagan citado no filme nos instiga a refletir mais sobre quem somos, de onde viemos e para onde vamos...

Fica aí a dica de Pedro Junior Silva para assistirmos e refletirmos...

Leo Nogueira Paqonawta

Publicado em Facebook
26 jan 2015

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

ADI 2404: Associação Brasileira de Rádio e TV quer derrubar classificação indicativa


Associação Brasileira de Rádio e TV quer derrubar classificação indicativa

Para ativistas, acabar com o mecanismo significa grave violação dos direitos da criança e do adolescente

Por Redação

A Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV (Abert) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 2404) contra a classificação indicativa. Na ação, o argumento seria de que o mecanismo “viola a liberdade de expressão das emissoras”. O julgamento começou em 2011 e está paralisado, mas quatro ministros já votaram favoravelmente à tese. O Supremo Tribunal Federal (STF) deve retomar a votação da Adin nos próximos meses.

Para ativistas, caso a classificação indicativa seja considerada “inconstitucional”, trará prejuízos à infância e à adolescência, já que a medida foi criada justamente para evitar abusos das redes e segue regras adotadas internacionalmente.

Porém, a constitucionalidade da classificação indicativa está expressa dos “artigos 220, par. 3°, inc. I e II; 221 e 227 da Constituição Federal e artigos 74, 75, 76 e 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de assegurar um direito fundamental previsto em diversos tratados internacionais de direitos humanos a fim de proteger a criança contra toda informação e material prejudiciais ao seu bem-estar”.

Em manifesto, ativistas exigem que uma audiência pública seja realizada antes da retomada da votação e também atentam para o fato de que “a política pública que regula a classificação indicativa no Brasil está de acordo com o direito internacional e se baseia na experiência de diversos países, como por exemplo França, Canadá, Chile, Argentina, Colômbia, Costa Rica e Estados Unidos, refletindo uma preocupação da sociedade com a proteção da criança e do adolescente no que diz respeito ao conteúdo veiculado pelos meios de comunicação, mas também como uma forma de tratar a questão da liberdade de expressão sem limitar indevidamente este direito”.

A seguir, leia o manifesto na íntegra:

“NOTA PÚBLICA EM DEFESA DA CLASSIFICAÇÃO INDICATIVA COM VINCULAÇÃO HORÁRIA PARA TV ABERTA

A Classificação Indicativa se constituiu e vem se consolidando como um instrumento democrático, com critérios claros e objetivos, determinados com intensa participação da sociedade. Hoje, a programação de radiodifusão é classificada pelas próprias emissoras e monitorada pelo Ministério da Justiça com o objetivo de proteger as crianças e adolescentes de eventuais conteúdos abusivos e violentos que possam causar dano a sua integridade psíquica e emocional. O processo é transparente, objetivo e democrático, sendo que eventuais penalidades somente são aplicadas mediante processo judicial com contraditório e amplas possibilidades de defesa.

Essa política pública busca equilibrar o direito à liberdade de expressão e o dever de proteção à criança e ao adolescente – cobrando do Executivo o cumprimento do dever de classificar, de produzir e estabelecer parâmetros para a produção de informação pública sobre o conteúdo de produtos audiovisuais; e, exigindo das emissoras de TV, dos distribuidores de produtos audiovisuais e demais responsáveis, a veiculação da classificação atribuída a cada programa e, em segundo, a não-exibição do programa em horário diverso de sua classificação. Por esse motivo, é inaceitável a tentativa de extinção da Classificação Indicativa via ação judicial (ADI 2404) que corre no Supremo Tribunal Federal movida para atender aos interesses das empresas de radiodifusão.

Nesse sentido, as organizações da sociedade civil abaixo-assinadas, considerando

1. A centralidade dos meios de comunicação eletrônicos no Brasil, sobretudo da televisão e do rádio, na formação biopsicossocial e cultural de crianças e adolescentes e a probabilidade de prejuízo causado por programação veiculada em faixa inadequada reforçada por três elementos: grande impacto (penetração nacional e consumo diário), dificultosa mensuração imediata dos efeitos e difícil reparação posterior;

2. A obrigação do Estado, sociedade e família de garantir os direitos da criança e adolescente ao bem-estar social, espiritual e moral e sua saúde física e mental que esta vinculação etária/horária da programação de rádio e televisão horária concretiza e proporciona;

3. A inquestionável constitucionalidade e legalidade da política de Classificação Indicativa tendo em vista a previsão expressa dos artigos 220, par. 3°, inc. I e II; 221 e 227 da Constituição Federal e artigos 74, 75, 76 e 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de assegurar um direito fundamental previsto em diversos tratados internacionais de direitos humanos a fim de proteger a criança contra toda informação e material prejudiciais ao seu bem-estar; e

4. A adequação da vinculação horária da classificação aos padrões internacionais de liberdade de expressão de acordo com o entendimento da ONU e Comissão Interamericana de Direitos Humanos uma vez que está claramente definida em lei; tem um objetivo absolutamente legítimo, tomando por base os textos internacionais ratificados pelo Brasil e pela própria Constituição Brasileira e mostra-se indispensável para garantir a eficácia da norma referente à proteção das crianças e adolescentes.

Vêm, por meio desta Nota Pública, solicitar seja realizada audiência pública no Supremo Tribunal Federal antes de que seja retomado o julgamento da ADI n° 2404, bem como reiterar apoio à Classificação Indicativa e à constitucionalidade da vinculação de horários, por faixas etárias da programação de rádio e televisão, além de repudiar o ato daqueles que visam a sua extinção por interesses essencialmente comerciais. E ainda, atentar para o fato de que a política pública que regula a classificação indicativa no Brasil está de acordo com o direito internacional e se baseia na experiência de diversos países, como por exemplo França, Canadá, Chile, Argentina, Colômbia, Costa Rica e Estados Unidos, refletindo uma preocupação da sociedade com a proteção da criança e do adolescente no que diz respeito ao conteúdo veiculado pelos meios de comunicação, mas também como uma forma de tratar a questão da liberdade de expressão sem limitar indevidamente este direito.”

Foto: Abratel

Reproduzido de Revista Forum
04 dez 2014


Conheça a Portaria 368 de 12/02/2014 do Ministério da Justiça, que estabelece novas para a Classificação Indicativa, clicando aqui.

Conheça a Pesquisa "Classificação Indicativa - o comportamento das crianças/adolescentes e dos pais/responsáveis em relação ao uso das mídias" (Dez 2014), clicando aqui.

Saiba mais sobre o tema Classificação Indicativa aqui no Blog "Telejornais e Crianças no Brasil", clicando aqui.

Comentário de Paqonawta:

A sociedade civil organizada não exige nada mais que a Constituição seja cumprida,  e que esta precisa ser regulada nos temas relacionados ao Capítulo V da Comunicação Social. Do mesmo modo, devem ser respeitados os direitos das crianças e adolescentes, observados os dispositivos dessa garantia também no Estatuto da Criança e do Adolescente e cartas internacionais e nacional desses direitos.

A ABERT, como associação que visa o interesse de empresas (que monopolizam) rádio e televisão, precisa respeitar tudo isso e se submeter aos imperativos da legislação vigente.

sábado, 15 de novembro de 2014

André Gravatá: Carta aberta ao mestre Manoel de Barros


Carta aberta ao mestre Manoel de Barros

Querido Manoel, não sei como começar esta carta… ela é uma tentativa de amarrar o tempo no poste. Como a gente amarra o tempo no poste, mestre Manoel? Esta carta é um vareio da imaginação, bem como o vareio que o senhor teve aos sete anos, quando tentou pegar na bunda do vento. Amarrar o tempo no poste é como pegar na bunda do vento?

Soube que o senhor está internado, temporariamente impossibilitado de pendurar bentevis no sol. O que o senhor tem que barra os bentevis? Há uma pergunta que dança em mim: os anos pesam o peso da pedra ou do algodão ou da pedra e do algodão ao mesmo tempo?

Escrevo-lhe esta carta para agradecê-lo pelo que fez por mim sem nem saber que fez. Pois foi com o senhor que se quintuplicou em meus voos a importância de apalpar as intimidades do mundo.

Foi com o senhor que descobri a esticadeza de horizontes e o carregamento de água na peneira. {Minha mãe até hoje reclama por eu passar todos os dias carregando água na peneira. Abaixo há uma foto minha com a peneira em que peneireio nascentes desde menininho.}


Foi com o senhor que aprendi a sapiência do bocó. Que aprendi a ser endivinado pelo orvalho e desaprendido pelas horas do dia. Que aprendi que dá para pegar na voz de um peixe. {Estava numa loja de papéis, e a pessoa que me atendeu disse que o filho dela, de uns 6 anos, gosta de poesia. Daí peguei uma caneta na hora e lancei sobre o papel um presente ao rapaz, uma peraltagem manoeleira: “As coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis. Elas desejam ser olhadas de azul”.}

Foi com o senhor que vi cenas nunca antes imaginadas nem no império brinquedeiro da minha infanciência. Com o senhor andei por um rio que cortava a tarde pelo meio. De azul, o senhor me mostrou outonos mantidos por cigarras e lamas fascinando as borboletas. Me mostrou um homem quase-árvore, que guardava um encolhedor de rios e um abridor de amanhecer {jamais vou me esquecer de como o abridor de amanhecer auroreia a terra}. O senhor me ensinou a apalpar os perfumes do sol. Me disse que as coisas que não existem são mais bonitas. E não entendi. E o senhor me deu um desafio: “ao voltar para a casa, fotografe o silêncio”. E tentei, tentei, mas não consegui sacar nenhuma imagenzinha do silêncio. E voltei para uma outra conversa. E perguntei como fotografar o que eu não via. E o senhor não me explicou, só me levou para perto de uma árvore em que pássaros gorjeavam. Que cena fecundante, que bonitezaria! E o senhor me perguntou: “por que o gorjeio é mais bonito do que o canto?”. Não soube responder, estava eu em estado de voz perdida, penetrado pelos gorjeios. Passou um tempo e o senhor continuou: “gorjeio é mais bonito do que canto porque nele se inclui a sedução. É quando a pássara está enamorada que ela gorjeia”. E o senhor pediu para eu olhar a árvore com atenção. “As árvores ficam loucas se estão gorjeadas”, disse. Sim, foi a primeira vez que vi o delírio de uma árvore. E foi como um balde de água cheio de fogos de artifício cremosos se derramando sobre meu olhar… Aí fotografei o silêncio do delírio da árvore gorjeada.

O senhor já me convidou para tantos festejos linguajeiros que nem há como agradecimensar tantas entradas no reino da poesia. O senhor é sábio em celebrar vazios – e sabe bem como chamar outros para partilhar sua fervura. O senhor convida homens sozinhos como pentes, que têm vozes em que nascem árvores. O senhor convida aves que sonham pelo pescoço, macacos que gorjeiam, lagartixas com odor verde, caramujos-flores, corós transparentes, ciscos feitos de gravetos, areia, grampos e cuspes de aves, mulheres de 7 peitos, moscas que se dependuram na beira de ralos, córregos, formigas ajoelhadas em pedras, baratas que passeiam nas formas de bolo, chuvas vestidas de sóis, meninos que veem a cor das vogais, sapos que sabem divinamentos, caracóis que não gosmam em latas, latas nuas e todos os tipos de pessoas com cabeças apinhadas de parafusos que farfalham.

Mestre Manoel, vidente das coisas trocadas, ousadioso dos instintos primevos, o senhor é mesmo o apogeu do chão. É quem monumentou as miudezas e também as formigas espremidas pela neblina. E o tibun das crianças. E a cobra de vidro que dá a volta por trás da sua casa.

O escrevimento dessa carta me deu vontade de rasgar inteirinhinha a fantasia da razão, está na cara que todos os caminhos levam à ignorância. Tenho gostos pela vadiagem com letras… Tenho que reaprender a errar a língua… E compartilho uma novidade: vou criar peixes no bolso, está decidido. Depois o senhor me manda algumas sugestões sobre cuidadoria de cardumes bolsais? Quem sabe dá para criar um Tratado Geral das Criações no Bolso.

Me despeço… Enquanto me despeço, remexo, com um pedacinho de arame, o poço das lembranças manoeleiras que guardo em mim. Os ventos levam-me para longe, os ventos lhe levam para longe… Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel, Manoel… repetir, repetir, repetir… até ficar diferente, até contrair visão fontana.

Que uma chuva de pingos de sol leves caiam feito mel sobre o senhor. Já é hora de eu tomar meu banho no orvalho da manhã.

Tibun.

André Gravatá

Obs.: Mestre Manoel, não foi possível amarrar o tempo no poste… Minutos antes de eu partilhar a carta que escrevi para o senhor, escrita com a água da fonte que sai dos olhos, o senhor voou fora da asa. Agradecimenso por pintar tantos azuis no mundo. Que o fim lhe olhe de azul também. Que o fim lhe olhe de azul. Manoel, Manoel, Manoel…

Reproduzido de André Gravatá
13 nov 2014


Comentário de Paqonawta:

Há séculos que eu não era envolvido por gotas tão iridescentes nos tibuns da vida. Correndo e cruzando as pernas no ar, me jogando todo encolhido nesse mar de sentimentos e pensamentos e, depois, abrindo o corpo inteiro e flutuando no multicolorido revoado dessa carta de amor e gratidão... Sorri, co-movido nessa e-ternuridade!


Leo Nogueira Paqonawta

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Juliana Doretto: Por que gosto de crianças


Por que gosto de crianças.

Por Juliana Doretto
Coluna Ruth de Aquino
Época

Esqueça essa história de que elas são puras, angelicais e ingênuas. O ser humano não é assim; e elas não são alienígenas. Também não quer dizer que perto delas nos sentimos mais jovens. Balela: elas têm uma energia que nos faz lembrar como já tivemos mais fôlego. Elas são engraçadas o tempo inteiro? Ao contrário. As menores não se constrangem em mostrar a tristeza e, como num drama televisivo mexicano, aprofundam a dor enquanto podem.

Eu gosto de crianças porque elas são um desafio. Pouco treinadas na arte das regras sociais, subvertem os códigos das respostas esperadas, dos comportamentos aceitáveis, do contrato de boas maneiras. Eu não quero dizer que adoro crianças birrentas e mimadas. Aliás, é comum ouvirmos hoje que os “miúdos”, como se diz cá em Portugal, estão cada vez mais terríveis. Mas não há nada de errado ou diferente com os meninos e meninas de hoje. O que parece ter mudado é o crescimento de uma dificuldade profunda dos pais em mostrar a seus filhos que a vida cotidiana é formada também por tijolos de frustração, entremeados por incompletude em massa.  O processo de educar, no sentido doméstico do termo, é mostrar que fazemos o possível, e conseguimos o que podemos.

A subversão a que me refiro é a resposta malandra, a esperteza de se saber mais inteligente do que seu interlocutor, mas esconder isso. Ou melhor: estar acostumado a sempre ser subestimado, e dar a volta, com brilhantismo, nessas situações. Eu, como pesquisadora e como jornalista, entrevisto meninos e meninas há uns bons anos. Já cansei de contar em quantas situações me senti uma estúpida, depois da argumentação brilhante da criança à minha questão – que eu achava muito bem articulada, até o seu desmonte total.

Não comece, caro leitor, com o discurso de que são as tecnologias que as fazem mais brilhantes do que nós éramos quando crianças. Você e eu já não nos lembramos muito bem das situações vividas na nossa infância. E, pelo que eu saiba, todo pai e mãe babões dizem ter filhos superdotados até que o contrário seja mostrado. E isso desde muito antes do telefone de disco.

Além disso, em minha pesquisa de doutoramento, entrevisto crianças com diferentes graus de uso das tecnologias. E não houve, nesse ponto em questão, nenhuma diferença berrante. A criança é esperta porque está aprendendo a viver num mundo onde poucos acham que ela tenha algo importante a dizer: e isso se refere sobretudo ao lugar que lhes é atribuído por excelência, a escola. Que o digam os bravos professores que lutam contra essa ditadura do silêncio infantil na sala de aula.

Vamos a exemplos, para clarificar meu ponto. Dou um livro a um menino e pergunto se ele gostou: “Não sei, ainda não li”. Pergunto a outro se ele é amigo de todas as pessoas que ele tem no Facebook: “É claro que não. Desde quando amigo do Facebook é amigo de verdade?”. Pergunto à menina se o celular dela já tocou no meio da aula: “Já, foi sem querer, mas eu tento cumprir as regras. Já minha professora atende sempre...” E, no meio da entrevista, a garota disse que o papo estava muito chato, e resolve parar a conversa para tocar violão.

Já o adulto resiste bravamente à entrevista moribunda, e responde a todas as questões do entrevistador, mesmo com ar enfadonho. Afinal, é preciso ser educado. Falar mal de outra pessoa numa conversa com um jornalista? É preciso pensar bem nas consequências do ato. Mostrar que a pergunta do investigador foi estúpida? Melhor não ser rude, ainda que a expressão facial do entrevistado não esconda (por mais que ele queira) sua opinião.

Por isso, para se relacionar bem com crianças que não são nossas filhas ou alunas (ou seja, com quem não temos muita convivência) é preciso, em primeiro lugar, ter respeito. Porque dali não virá o tipo de comportamento a que estamos acostumados. Dali virá uma esperteza refinada e uma sinceridade ponderada: elas já sabem que não podem contar tudo, mas a forma como escolhem o que dizem não está no nosso catálogo social. Faz parte da maneira como elas descobrem o mundo, dos códigos que já absorveram ou não.

Por isso eu gosto de crianças. Porque elas são tão mais bem-humoradas do que os adultos. Elas tiram sarro na nossa cara, e fingem que não têm consciência do que estão a fazer. Com as bobagens que andamos ouvindo em época pós-eleitoral, seria bom aprender com a brejeirice das crianças.


Juliana Doretto . Paulista, jornalista e faz doutorado em Ciências da Comunicação na Universidade Nova de Lisboa

Reproduzido de Época
09 nov 2014

Conheça a página “O Jornalzinho” (Diário de uma pesquisa de jornalismo infantil) de Juliana Doretto, e o perfil da jornalista/pesquisadora, clicando aqui. Mais informações sobre seu livro "Pequeno leitor de papel", clicando aqui.


Comentário de Filosomídia:

Gostei muito de sua crônica e das cutucadas que nos dá para refletirmos a respeito de como nos relacionamos com as crianças - filhas e mesmo as desconhecidas - na vida, em casa, na escola e na pesquisa nesses dias atuais. Nossa "desconcertância" em frente a elas coloca esse desafio de apurarmos nossas percepções e superarmos limites que colocamos nessa relação eventualmente marcada por preconceitos, presunção na "vontade de dominação" delas e, decerto mal humor.

Lembrei de Jorge Larossa em "O enigma da infância" no "Pedagogia Profana" e algumas citações bem provocativas dele, por exemplo, Peter Handke: "nada daquilo que está, constantemente, citando a infância é verdade; só é aquilo que, reencontrando-a, a cita". Você, Juliana Doretto, citou e mandou bem. Obrigado e, vamos que vamos nos desconcertando, des-cobrindo essa criançada e nos des-cobrindo com elas em meio a esse mundo, digamos, tão complicado, que nós insistimos em viver...

Bem ver, bem ouvir e bem falar com as crianças é difícil, é fácil...

Paqonawta

domingo, 9 de novembro de 2014

"Publicidade infantil em questão no Brasil" é o tema da redação do ENEM 2014


"Publicidade infantil em questão no Brasil" é o tema da redação do ENEM 2014

"O tema da redação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) é "publicidade infantil em questão no Brasil", informou MEC (Ministério da Educação) neste domingo (9/11/14) em sua conta do Twitter.

O MEC também informou que para ajudar a produção dos textos, a proposta de redação traz um texto jornalístico que discute se a publicidade infantil deve ser proibida no Brasil, um infográfico sobre a publicidade para crianças no mundo e um texto sobre a criança como o consumidor do futuro."

Reproduzido de UOL Educação
09 nov 2014

Infográfico do enunciado da prova (Editoria de Arte/Folhapress 2013). A questão teve trecho do livro "A Criança e o Marketing".


Comentário de Filosomídia:

Boa essa, MEC! Uma pulada de corda com mais de 8 milhões de pessoas junto, refletindo e escrevendo sobre o tema! Boa, MEC!

Leo Nogueira Paqonawta

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Estudante de 7 anos manifesta a favor dos professores


Estudante de 7 anos manifesta a favor dos professores

Público foi modesto, mas menino diz que pretende continuar

Alexandro Barboza

O pequeno Ian Ainoã Duarte, de 7 anos, decidiu se mobilizar a favor dos professores em Campo Grande. Em um vídeo divulgado no Facebook, ele pede para que a prefeitura da Capital pague o teto salarial e evite a greve da Rede Municipal de Ensino. Também, nesta manhã, 5, o estudante da 1ª série, na companhia de colegas e pais se manifestaram em frente a Escola Municipal Elpídio Reis.

De acordo com a mãe do menino, a fotógrafa Kísie Ainoã, ele chegou em casa revoltado com a notícia e, um vídeo, gravado por sua tia, se espalhou pela internet. No vídeo, o menino questiona o fato da prefeitura arrecadar tanto dinheiro com impostos e alegar não ter dinheiro para pagar o teto dos professores. Ele ainda diz que pretendia mobilizar 24 pessoas mais alguns colegas de classe.

Munido de cartazes e ao lado dos colegas Rafael e Nicolas, Ian não conseguiu o público esperado nesta manhã, o que era uma preocupação da mãe, que auxiliou o filho na divulgação do protesto. “Fiquei com medo do protesto ser um fracasso e isso de certa forma frustrar o Ian, mas, novamente ele me surpreendeu. Ao final, ele me acalmou dizendo que o primeiro protesto é assim mesmo, e que nos próximos, que ele irá realizar, os resultados serão diferentes”, comenta a mãe. 

Sem esconder o orgulho do filho, Kísie disse ao Diário Digital que Ian nunca recebeu nenhum incentivo para entrar nestas causas sociais. “Tudo sempre parte do próprio Ian. Na vez do protesto pelos R$0,20 da passagem de ônibus, por exemplo, ele não chegou a ir às ruas, mas se pintou todo e fez o próprio protesto em casa”, completa.

Ainda segundo a mãe, o menino adora assistir tutorias e faz vídeo de tudo que costuma fazer, um sinal de que Ian ainda deve fazer parte de muitos movimentos por causas sociais. Tudo indica que o intitulado “Protesto a favor do cumprimento do Piso Salarial dos Professores em CG – MS”, foi apenas o primeiro passo do garoto.

Greve

Os professores da Rede Municipal de Ensino (Reme) decidiram rejeitar a proposta do prefeito Gilmar Olarte e votaram pela greve. A votação ocorreu na última segunda-feira (3) na sede Sindicato Campo-grandense dos Profissionais da Educação Pública (ACP), durante uma Assembleia Geral que reuniu cerca de 800 servidores.

Os professores confirmaram o indicativo de greve, após rejeitar a proposta apresentada ontem pelo prefeito, onde afirmava que recebendo a Outorga Onerosa da Águas Guariroba, a prefeitura faria o pagamento retroativo de 8,46%, de uma só vez, até o dia 30 de novembro de 2014.

Segundo o sindicato, categoria cobra o cumprimento da lei municipal 5.189/2013 que determina a integralização do piso municipal, atualmente é de 1.564,97, ao piso nacional dos professores, de R$ 1.697,37. O início da greve está previsto para esta quinta-feira (6).

Reproduzido de Diário Digital
05 nov 2014



Comentário de Filosomídia:

Muito bem Ian!

Que alegria, que bacana, como você nos inspira a indignação e a agir pelo bem e pela justiça!

Taca-le pau com sua indignação, combatendo todas as injustiças, apoiando professores e crianças do Brasil e do mudo inteiro para que tenham excelentes escolas, excelentes condições de trabalho e estudo, excelentes recreios, bibliotecas, brinquedotecas, jardins, alimentação, saúde, quadras para práticas desportivas, piscina, brincadeiras e tudo o de bom que possamos imaginar para que as escolas sejam um lugar de belas descobertas para a vida, sempre com amizades queridas.

Sou professor de crianças dos Anos Iniciais e, conheço muitas crianças que também apoiam tudo isso pelo qual você está lutando com seus colegas. Realmente é muito estranho que os cidadãos e cidadãs - e principalmente as crianças - tenham seus direitos desrespeitados por autoridades públicas e, pior ainda, como se não fosse dever dessas autoridades fazer de tudo para que se cumprisse, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a Declaração Universal dos Direitos das Crianças (1959), o piso salarial dos professores, que ainda é bem baixo...

Enfim, essa luta é difícil e, como você disse tranquilizando sua mãe, com o tempo mais e mais pessoas - a começar por seus colegas de escola - se unirão para defender, proteger e promover os direitos humanos e os direitos das crianças.

Muita força, ânimo, alegria e amor na sua vida, de seus familiares, professores e amigos.

Vamos nos falando, com mais professores e mais crianças, mais pais e mães, mais amigos até que todo mundo esteja vivendo com alegria, paz e amor.

Obrigado por compartilhar conosco o seu vídeo, e vamos compartilhando ele para que mais pessoas se juntem e apoiem essa luta!

Espero te encontrar em breve para bater um papo bem bacana, já que mesmo sendo professor também continuo estudando, agora no doutorado, para descobrir numa pesquisa os porquês de ser tão difícil ver, ouvir e falar com as crianças nas escolas, e perceber que pela imaginação delas (como a sua) poderíamos estar aprendendo e descobrindo um mundo melhor.

Espia aí como você vai nos ensinando a imaginar e a re-criar um mundo melhor, com tanta graça e alegria...

Um abraço agradecido estalando de orgulho por você e seus colegas.

Leo Nogueira Paqonawta

...

Postado no espaço de comentários do vídeo, Canal de Youtube de Ian Ainoã Duarte.

06 nov 2014

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Vale tudo para crianças? Uma reflexão sobre a espetacularização da violência desde a infância, por Laís Fontenelle


Vale tudo para crianças?

Uma reflexão sobre a espetacularização da violência desde a infância

Laís Fontenelle*

O MMA (Mixed Martial Arts) – Artes Marciais Mistas, na tradução para o português – tem ganhado cada vez mais novos adeptos da prática. Pasmem! Segundo últimas notícias em jornais internacionais e nas redes sociais crianças menores de 8 anos têm se enfrentado em ringues ou palcos octogonais pelo mundo, mais especificamente EUA e Armênia, com sangue nos olhos e golpes para lá de adultos- que demonstram uma espetacularização da violência desde a infância e pode ser visto no vídeo (abaixo). É fato que o boom do MMA, como um espetáculo midiático, que envolve diferentes artes marciais, faz sucesso há tempos em nosso país- seu criador – e mundo afora e que também não é de hoje que se observa uma adultização da infância quando vemos cada vez mais crianças ocupando papéis antes reservados ao universo adulto. Então vocês devem estar se perguntando o que tanto me chocou nas notícias que li.

Talvez o que mais tenha me chamado atenção, em tempos tão violentos – quando uma cultura de paz se faz urgente – foi ver que crianças, desde a mais tenra idade, têm sido treinadas ao ataque e encorajadas, por suas famílias, a ter um desempenho de galos de briga ao participar de um espetáculo que cultua e propaga a violência. E acho que não fui a única a questionar essa nova moda, pois o que andei lendo foram relatos bastante indignados de profissionais da saúde e educação e até o próprio presidente do UFC, Dana White, criticando a realização dessas lutas infantis. Para quem não está tão por dentro vale mencionar que UFC (Ultimate Fighting Championship) é hoje a maior organização de artes marciais mistas do mundo, que contém os maiores lutadores do esporte e produz mega eventos ao redor de todo o mundo.  Mas, muito mais do que um evento, podemos dizer hoje que o UFC é uma marca que vende; muito mais do que roupas, ídolos, acessórios de luta ou organiza eventos- ela vende valores como competição, derrota, luta, ataque, performance, ganhador X perdedor.

Vale destacar que não quero dizer aqui de forma alguma, até como esposa de um Karateca e filha de Judoca, que lutas de contato são maléficas para as crianças ou que a prática de artes marciais é inadequada na infância porque, sem dúvida, tanto essas lutas quanto as artes marciais podem ensinar valores bem importantes como: Autocontrole, Foco, Dedicação, Comprometimento, Defesa e principalmente Respeito. Porém, tudo tem seu tempo e sua indicação. No Karatê, por exemplo, que significa mãos vazias, o que se busca é mais autoconhecimento do que competição e crianças menores de oito anos não podem, em locais sérios, exercitar a prática. Há até um ditado dentro desta modalidade que diz que “o Karatê começa na faixa preta”, o que significa que apenas depois de muita experiência se é capaz de começar a compreender o verdadeiro significado de uma arte marcial. No Judô o oponente não é tido como um adversário que merece ser nocauteado e sim como alguém que merece respeito na sua prática. Os golpes podem até ser enxergados como um balé a dois. Existem muitas regras claras de proteção à integridade física do seu oponente. O tatame é tido, inclusive, como uma terra santa.

Já o que tem acontecido nesses ringues é algo totalmente diferente e que passa longe do respeito exercitado através de outras lutas. O que se vê é uma espetacularização da violência onde crianças pequenas são convidadas a se digladiar enquanto adultos voyeurs gozam divertindo-se e tomando cerveja. Tudo isso à custa de comprometimentos físicos nos ligamentos, ossos e pescoços das crianças sem contar com os danos emocionais e as marcas subjetivas que podem ser acarretadas por essa prática abusiva . Não se pode nunca esquecer que nossas crianças são seres em desenvolvimento psíquico, físico e emocional e que aprendem através de modelos adultos. Precisamos então parar e pensar no que estamos permitindo que seja feito com as crianças e seus corpos expostos. O das meninas, cada vez mais erotizados e despidos, e dos meninos expostos nessas lutas espetaculosas. Tanto as artes marciais quanto as lutas de contato envolvem conceitos sérios que a criança ainda não tem formados dentro de si. Essa prática esportiva, extremamente competitiva aos meus olhos, quando praticada na infância não traz  nada além da expressão de uma agressividade gratuita. Porque acredito que as crianças que ali entram para lutar não tem ainda a capacidade de entendimento total do que esse espetáculo envolve. Assim como, tenho certeza que, as meninas que desfilam em passarelas de mini miss também não têm a dimensão do que é essa experiência – e talvez seja até por isso que o Estado Francês discutiu com a devida seriedade esses concursos também.

Esse cenário não pode se armar e se tornar realidade. Nossas crianças precisam exercitar valores mais cooperativos do que competitivos e de ataque. Vivemos um momento especial no mundo em que diferentes manifestações de violência têm acontecido e sido cada vez mais recorrentes e ainda nos perguntamos o que tem acontecido. Nossas crianças têm sido convidadas ao combate e a luta, desde pequenos, quando o que mais se precisa hoje talvez seja de cooperação, solidariedade e troca afetiva- valores que não se aprende nesse tipo de embate.

E nem adianta vir com explicações, como a de um treinador desses pequenos lutadores, que disse que ele promove somente diversão e exercícios físicos entre esses meninos.  O que se promove são nada mais do que cenas brutais de aviltamento da infância. As crianças precisam de mais respeito e do entendimento de que coragem significa agir com o coração e isso começa em nós adultos. Temos o dever de questionar ou, pelo menos, estranhar espetáculos como esse. Crianças precisam brincar como exercício de comportamentos adultos. Elas não precisam de ringues ou palcos para construção de conceitos como feminilidade, masculinidade, coragem e bravura.  Para nossas crianças não vale tudo. Deixo aqui minha indignação.

13 nov 2013


* Laís Fontenelle é Psicóloga, mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio com dissertação intitulada “Moda Clubber e Raver: uma tendência na cena contemporânea”. Atualmente coordena a área de Educação e Pesquisa do Projeto Criança e Consumo do Instituto Alana.

Atuou na área de Educação Infantil durante nove anos no eixo Rio de Janeiro e São Paulo. Também realizou atendimento terapêutico em crianças com problemas de aprendizagem e assinou a coluna Consumindo Ideias da Folhinha do Jornal Folha de São Paulo em 2009. Especialista no tema Criança, Consumo e Mídia é hoje uma ativista pelos direitos das crianças viajando o país sensibilizando corações e mentes para o problema do consumismo na infância.


Conheça a dissertação de mestrado (2003) de Laís Fontenelle clicando aqui.



Comentário de Filosomídia:


Muito bem, Lais Fontenelle. Tanto a "lutar" pelos direitos das crianças à infância...
Se a gente não fica atento a esse tipo de agressão aos seus direitos daqui a pouco - sob os olhos, bocas e ouvidos dos poderes públicos constituídos - esse tipo de "show" vai pra grade de programação infantil domingueira das redes de TV hegemônicas mirando o nicho de mercado de consumo. É assim que essas empresas agem, sem compromisso nenhum com a ética e os direitos humanos... Lamentável...


Leo Nogueira Paqonawta

sábado, 2 de novembro de 2013

Precisamos de uma Educação transformadora


Precisamos de uma Educação transformadora

Leo Nogueira Paqonawta

Nos últimos 50 anos o mundo e a sociedade como um todo se modificaram profundamente e, as pessoas que viveram esse tempo se modificaram mais ou menos, de acordo com suas próprias decisões em relação com o que acontece ao seu redor. Nas escolas isso não foi diferente.

Pessoas que nasceram e viveram em um regime autoritário como na ditadura militar no Brasil, onde se devia obediência cega e irrestrita às normas e valores convencionados como os ideais para se viver em sociedade, ainda manifestam em suas ações e se comportam em seus pensamentos e sentimentos com resquícios daquele tempo em que os dirigentes censuravam tudo aquilo que fosse contrário às suas regras. Simplesmente se calava a voz do outro, se discriminava e se fazia de tudo para “sumir com as pessoas do mapa” no mundo de equilíbrio entre quem mandava e quem obedecia.

Hoje há uma maior conscientização dos jovens a respeito de sua existência nesse mundo em transformação, quando as decisões ou imposições que antes eram tomadas sem levar em consideração seus sonhos e aspirações, de maneira autoritária, não são mais aceitas de maneira passiva, nem cegamente obedecidas. As crianças, muito mais, que sempre questionaram com seus “porquês” aquilo que não entendem ou não faz sentido para elas, são atualmente um claro sinal de que realmente muita coisa se modificou ao longo desse tempo todo.

Com a luta e os esforços de muitos a sociedade vai se modificando das relações autoritárias para as relações democráticas e participativas. As decisões não podem mais partir de apenas uma pessoa, ou grupo, impondo seus pontos de vistas sem levar em consideração todos os sujeitos envolvidos em alguma questão de interesse geral. Nas escolas isso também acontece.

É a Comunidade Escolar com todos aqueles que a formam quem deve se responsabilizar e se comprometer pelo destino, rumos e finalidades da Escola.  Os alunos, familiares, pais e responsáveis, Professores, funcionários, coordenadores pedagógicos (diretores, administradores, orientadores e supervisores educacionais) é que são os sujeitos que fazem essa Escola. São os que devem se unir em torno de um “projeto” comum, amplamente discutido, debatido, refletido a partir de suas próprias realidades, vivências e experiências e construir os “porquês” de a Escola seguir em direção ao bom cumprimento de suas finalidades enquanto instituição de ensino. Essas discussões formam um documento que chamamos de “Projeto Político-Pedagógico” da Escola. É um documento que vai orientar os passos da Escola e de toda a sua comunidade, os passos de todos em comum na realização de todos os processos que se unem em favor de uma Escola democrática, participativa, com a colaboração de todos. Nem sempre nas escolas foi assim.

Podemos perceber que no mundo inteiro há pessoas, grupos organizados na luta pela defesa dos direitos humanos (a quem chamamos de sociedade civil) e outros bons representantes e setores da sociedade (poderes executivo, legislativo e judiciário) insatisfeitos com os desrespeitos às conquistas que garantiriam a todos uma melhor qualidade de vida e condições plenas de humanização para viver. Acontecem ao redor do planeta manifestações gigantescas que estão sendo observadas entre todos os povos, em todos os países, e crianças, jovens, adultos e idosos já não aceitam situações que lhes foram impostas arbitrariamente por algumas poucas pessoas, ou grupos interessados em controlar o mundo e tudo e todos que nele habitam.

Quando as mídias, os jornais, a televisão e a Internet não distorcem os fatos, constatamos essas manifestações como pura expressão de um descontentamento com o que está posto ou se impõem às pessoas.

Como é que é estar insatisfeito com os rumos e as decisões que acontecem nas escolas? Como é que os sujeitos que compõem a comunidade escolar se manifestam a favor ou contra do que acontece nas escolas? Essas insatisfações acontecem E, são ouvidas, acolhidas, e os sujeitos da comunidade escolar que manifestam suas reivindicações são respeitados em seus direitos de falar e participar dos rumos e destinos da escola?

As insatisfações das crianças e jovens acontecem? E as dos pais e responsáveis? E os professores e funcionários? Como, quando, onde, por quê? Quais são essas insatisfações?

O momento especial da discussão, debate e reflexão em torno da eleição para o cargo de diretor das escolas é uma oportunidade imperdível para tomarmos posições sobre o que temos e o que queremos para as escolas. É nesse momento que também expressamos nossa confiança - ou desconfiança - sobre o projeto de gestão que vai sendo construído para a discussão com a comunidade escolar.

Esses projetos são de continuísmo e conformação com o que está posto, ou é um projeto que tenha concepção na participação democrática e efetiva de todos os participantes da comunidade escolar? Esses projetos são de “direção” da escola ou de “gestão democrática” da escola?

O mundo, a sociedade, as pessoas, as crianças, os jovens, os adultos e idosos que querem o Bem Viver estão se transformando profundamente, porque as relações precisam ser mais democráticas e mais humanizadas nesse planeta em que vivemos. Nessa realidade global tudo está relacionado, todos estamos interligados uns aos outros.

Ou estamos conectados como “coisas”, como peças descartáveis dentro de um sistema desumanizador, ou estamos interligados como “sujeitos” de direitos e deveres, no compromisso de resgatar nossa humanidade que nos foi retirada sutil ou escancaradamente por uns poucos que dirigem nossas vidas.

É preciso modificar uma dinâmica que foi imposta às pessoas por anos e séculos, para que estas se formatassem como “peças descartáveis” do sistema que privilegia poucos e oprime a muitos. Essa “roda” do continuísmo irresponsável e impunemente arrastando, atropelando, moendo e triturando consciências, sonhos, aspirações, as pessoas, os grupos e o mundo já não funciona mais como funcionou antigamente. Um antigamente que ainda se faz forte, quase irresistível, presente em muitas pessoas, grupos, projetos e propostas de direção das escolas.

É preciso modificar nossas atitudes, modificarmos nossas consciências, é preciso reconhecer nossa dignidade de sujeitos com direitos iguais, é preciso que nos transformemos em seres humanos para recriarmos um mundo melhor para todos, onde todos sigamos juntos nessa caminhada e evolução, nos co-movendo por um projeto de vida emancipador, democrático, participativo, responsável.


É preciso que essa transformação se realize nas escolas.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Infelizes dias das bruxas nas escolas...


Assédio moral nas escolas - I

Apontamentos sobre tiranias que se veem, falam e se ouvem no reino da fantasia e no mundo real das malvadezas des-humanas

Por Leorry Reportter*

Assédio moral nas escolas é um assunto nada tratado nas fileiras de muitas corporações de professores do país, e sequer passa pela cabeça de algumas pessoas que, Vocês-Sabem-Quem, existem por aí nas unidades escolares, públicas e privadas, mesmo quando aquelas carapuças de carrasco bem serviriam a nomear quem é quem e de que “lado” está nas lutas pela Educação: o lado de baixo ou o lado de cima. Quando certas relações de opressão são praticamente naturalizadas desde os bancos dos colégios - entre os pares mal-formados nos bancos da academia, e seguem de-formados no ambiente de vaidades e mediocridades de escolas que frequentamos pela vida, como estudantes ou trabalhadores - é sinal de que se perdeu algo importante das finalidades, a bússola que dá o rumo do que é proposto por Educação em seus mais altos níveis de compreensão e expressão na reflexão e prática pedagógica.

Não há quem não tenha observado, visto falar ou ouvido em alguma escola pela vida afora, da presença dos Pedagófilos, pessoas que na sua irrefletida atitude são exímios assediadores. Elas são as que literalmente violentam os corações e as mentes de colegas, alunos, funcionários e familiares que passam à sua frente. Estão por todos os lugares distribuindo “elogios” que mal disfarçam as verdadeiras intenções de ludibriar, menosprezar, diminuir, ofender, de colocar “no seu devido lugar” os menos lustrados pelo vernizinho de diplomas que carregam com propalada ostentação. A soberba é uma anti-virtude que os caracteriza.

Essas pessoas têm uma aura ensombrecida, uma aparência de frieza calculada, distribuem olhares complacentes desde a altura de seus narizes e, medem o mundo pela curta distância desde seus umbigos ao corações enregelados. Quando não deslizam pelos caminhos de todos em seus gestos aparentando um balé de cisne negro, braços como asas abertas e às vezes em echarpes esvoaçantes, sentam-se feito paxás nos lugares privilegiados onde todos possam mirá-las. E ficam lá fingindo atenção à voz alheia, meneando a cabeça em negativas de tudo o que se diz, aguardando sua “deixa” para dar sua opinião que quer abalizada, e determinando a conclusão com força de lei para qualquer assunto entabulado.

Tidas como oráculos a quem se recorre para dar seus vereditos finais desde alguma questiúncula às mais altas predições sobre um futuro em que elas próprias se destaquem magnânimas, querem que para dar seus vaticínios e análises se acendam incensos e velas para perfumar e brilhar os altares que só a adulação consegue manter em pé, por algum motivo que a própria razão desconhece.

Além dos adoradores do público em redor de sua presença fazem-se grupelhos pelos cantinhos. Vez ou outra quase todos ficam estremecidos às suas gargalhadas homéricas, e sente-se no ar o medo de muitos quando pressentem aquele aroma fedorento que antecede sua entrada triunfal em algum recinto. Noutras vezes, confabulam-se com seu séquito por sussurros e risadinhas contidas, seguem-se olhares em todas as direções para evitar que lhes ouçam os segredos. Ao final de todas as veementes argumentações sempre têm palavras reticentes e ferinas para arrematar a punhalada de sua verborreia astuta, que flui ora como trovão dos deuses do Olimpo, ora como o sibilar de uma serpente que estrangula a vítima, ou lhe diz o que fazer com finalidades questionáveis.

Esses infelizes, que não perdem uma oportunidade sequer de criar a infelicidade para os outros, vão desde sempre des-tratando as pessoas da comunidade escolar em privado e em público, falando pelos cotovelos como eminentíssimos doutores de uma lei que eles próprios inventam, destilando os venenos que compõem dia-a-dia os artigos e regimentos do famoso “currículo ocultíssimo” com as marcas da violência que a tudo destrói e arrasa.

Num estilo de quem faz e des-faz arrogando-se poder sobre a vida e a morte, como os imperadores romanos no circo abaixando os polegares ao som da turba furiosa - histérica e excitada com o espetáculo de sangue na arena - os Pedagófilos não se apoquentam se o circo pega fogo ferindo vidas e destruindo sonhos depois que as des-graças e boatos que espalham tomam seu caminho entre corações e mentes em formação. Esse tipo de pessoas querendo mandar a torto e a direito também tem semelhança com os poderosos da Santa Inquisição dos tempos medievais, os donos da verdade absoluta, mandatários da vontade divina.

Feito príncipes e princesas da maldade invejosa, se passando por reis déspotas e rainhas da cocada preta, debocham de quem ousa destoar de suas regrinhas que propalam com seus trejeitinhos caricaturizados, ou passam à sua frente atrapalhando a visãozinha míope que têm de seu mundo de desejos e fantasias de poder. Pior ainda, quando em perdendo um “trono” ou os “anéis” em que lhes beijavam as mãozinhas desmunhecadas, eles não se sentem que perderam os dedos da manipulação de tudo e de todos. Esses infelizes seres se fazem como as eminências pardas por detrás de outros que aturam - mas estão no poder por direito - planejando incontáveis intrigas para perturbar, promover a discórdia e o engano para controlar e oprimir o povo.

Figuras que entram para a “história” como heróis, suas condutas trazem ao presente de nossas existências o pior que caracterizou a instituição escolar no decorrer de séculos de autoritarismo e arbitrariedade, de impunidade.

Os Pedagófilos são pessoas que, por princípio de sua necessidade de poder, atraem a si uma força que lhes dão esse poder quase desmedido, e controlam consciências com a facilidade de um maestro que rege uma orquestra para que todos dancem conforme a sua música que faz todos entrarem em transe delirante.

Sarcasmo é o tom percebido em todas as palavras mal-ditas que saem de suas bocas se referindo ao outro, ao completamente diferente de si, ao trabalho dos colegas. Falam sempre com desdém e com aquele jeitinho “blasé” de quem se sente entediado, ou mal suportando a presença alheia que empana o brilho de suas majestades afetadas. Como há sempre uma “corte” a seguir e “cortejar” tal realeza pomposa e cheia de circunstância, a maldição que espalham à sua volta vem também sempre com os salameleques que caracterizam todos aqueles acólitos e paus-mandados que se subalternizam ou veneram tais personalidades, digamos, “magnéticas”, que sabem os segredos do hipnotismo vulgar e pretendem que os demais se sintam mais inferiores que elas próprias na sua auto-significância.

Como de costume, e na sua tática e estratégia de oprimir e explorar o próximo para seus fins de dominação nefasta, falam pelos cotovelos e espalhafatosamente - e quase sempre pelas costas - dos infortunados que caem em seus bicos e garras de rapina que se alimenta da morte. Ou estão invariavelmente à espera e à espreita de uma oportunidade e situação para dar um bote qualquer. Agem sub-repticiamente, sorrateiramente, creem ter o dom de especialistas que opinam sobre tudo naqueles moldes de quem faz futrica e fofoca, querendo se passar por inteligentíssimos em seus proverbiozinhos com tintas sujas da pornolalia que expõem, sobretudo, a própria podridão e escolhas íntimas de quem é vil ou tem gosto e atitudes duvidosas.

Em geral, essas infelizes pessoas têm um discursinho fajuto e superficial que fala e pretende ter ares de responsabilidade, de ética e profissionalismo na prática pedagógica, e defendem com zelo de fariseus hipócritas os direitos inalienáveis dos seres humanos, de crianças, jovens, colegas de trabalho, arrogando-se o dever de em tudo dar palpite como sumo sacerdotes infalíveis em seus pronunciamentos. Mas não admitem, jamais, que seu questionem os seus próprios “direitos”.

Para qualquer assunto têm alguma tolice a dizer e, na mesma medida, algum tolo por perto a se maravilhar com os impropérios disparados feito metralhadora desembestada, aqui e ali, desde a cozinha de suas casas à salas de aula, às salas de professores e corredores, porque estão sempre a vigiar, para punir segundo seus julgamentos sumários em seus estrelismos de divas malvadas das novelas das “8”.

Esbanjam soberba, arrogância, esnobismo, e precisam do palco armado onde for para seus teatrinhos chinfrins sobre uma “aula bem dada” ou a determinação sobre alguma coisa que opinam com aquela categoria duvidosa que só os medíocres conseguem ter. São pessoas que mereceriam o “Oscar” de melhor drama por seus gestos e arroubos cheios de afetação, por suas caras e bocas nas atuações em que se esmeram pretendendo ser fiéis ao papel de atores ou atrizes principais de um filmezinho, obviamente de terror.

Bocas sujas e língua ferina, vão costurando alianças ao longo de sua existência na característica falta de dignidade de quem amarra o rabo em troca de privilégios tolos e mesquinhos aos que lhes adulam em coro, quando lhes deveríamos o apupo e a vaia. Na contraposição às suas atrocidades muitas vezes o silêncio de quem consente, por medo e intimidação. Noutras vezes, as pessoas simplesmente aturam esse comportamento porque também naturalizaram o que se tornou lugar-comum em nossas instituições de exaltação da violência e subserviência a esse tipo de pessoas que se julgam maiores, e melhores que todos.

A seriedade de gabinetes públicos nunca lhes reservaria uma cadeira de responsabilidade porque isso exige lisura e ética, o mínimo de sabedoria para o desempenho das responsabilidades em cargos de relevância. Talvez, por isso, suas atitudes são, via de regra, limitadas a um campo menor de ação, que decerto causam menos estragos do que em multidões que necessitam mesmo é de boa vontade na política. Talvez, também, seja por isso que essa deferência que lhes é obviamente negada se extravase no rancor e despeito de seus ataques ao desempenho dos outros que cita por seus desafetos políticos.

Um exame de seus pensamentos e ações jocosas, mixuruca que fosse, decerto daria pano pra manga num consultório de clínica psiquiátrica, ou uma biblioteca inteira sobre aquilo que dominam muito bem: o saber sem “substância”, sem respaldo na reflexão e no estudo sérios, que acabam por terem um teor igual ao das revistinhas sobre celebridades das mídias e do show business em salas de espera. São metidas a querer se passar por “sábios” conselheiros e suas crendices têm o requinte do cúmulo do mais baixo nível do senso-comum. As idiotices vomitadas a título de opinião formada sobre tudo enjoam aos que têm de ouvir suas declarações. São tidos como temidos por suas posições superficiais e dramáticas sobre qualquer ponto ou conto onde quer que se apresentem estrondosamente, e em sua presença melhor se calar para não encompridar conversas desnecessárias, ou no mesmo teor de vulgaridades e futilidades.

Mesmo quando se esforçam por querer passar uma imagem ou aparência de legitimidade de alguma coisa, quando muito são tidos por de-formadores de opinião. E, se acham o “máximo” porque eles mesmos des-conhecem que são motivos de chacota da opinião alheia quando fazem de tudo por se manterem em evidência, o centro das atenções e das luzes nos muitos palcos de suas encenações de quinta categoria. Assim como acreditam nas próprias banalidades como assuntos do mais alto teor em forma erudita, pensam que suas “críticas” não são de fato a titica de galinha do poleiro dos futriqueiros que cuidam da vida de todos da escola, mas se esquecem de suas próprias imperfeições.

No mundo da fantasia, nas páginas dos contos e fábulas infantis, há personagens incontáveis que retratam pessoas como esses Pedagófilos, desde o Lobo Mau assediando os Três Porquinhos e a tia encruada da Cinderela, à rainha tresloucada que mandava cortar as cabeças no País das Maravilhas. Temos as bruxas malvadas que perseguem reinados inteiros e cada cidadão vivente neles bem como as fadas e anõezinhos, e aquela que fez uma casa com doces para João e Maria se aprisionarem nela. Outras muito conhecidas são a que morre com uma casa caída em sua cabeça e uma outra, se derretendo com uma simples gota de água no final das aventuras em Oz.

Em outra história famosa, o infeliz - Smeagol - que começou a se despencar como ser humano, matando por possuir um anel de ouro que trazia um poder supremo com ele, usou de uma estratégia orientada pelo “Grande Olho do Mal”, e se apresenta como solícito guia de dois jovens que querem libertar sua pequena vila do jugo do opressor. Para possuir “O Precioso” e realizar seus sonhos de grandeza não hesitou em mentir, ludibriar, enganar e matar. Des-humanizou-se todo nesse caminho até se parecer como monstro feito aqueles criados para exército de horrores a serviço do algoz maior, enquanto os que se uniram em torno do “Retorno do Rei” se elevaram, evoluíram, transcenderam, recriaram as esperanças para tornar o mundo melhor. Foi uma jovem guerreira aquela que defende o pai contra o preposto do “olho gordo”, decepando a cabeça daquele bicho voador e espetando a espada para fazer sumir tal coisa ruim.

Mais ainda, outro menininho, desses que ninguém dá nada por ele, humilde e apagado, foi quem teve a verdadeira força interna que remove montanhas, e retirou a espada da pedra, tornando-se o Rei e líder daqueles Cavaleiros da Távola Redonda, a quem outra bruxa horrorosa fazia de tudo para impedir os sucessos.

São tantas histórias que já nos contaram desse tipo de pessoas, dos incrivelmente ruins, odientos e egoístas contra os simples e humildes que querem apenas uma vida melhor...

Talvez uma personagem que resuma e retrate exemplarmente esses atributos de gente que não é do primeiro escalão, mas se acha o supra sumo, manda e quer ser obedecida irrestritamente - no caso, uma escola - seja Dolores Umbridge. A famosa ex-diretora de Hogwarts com seu sorrisinho cínico em jeito de “boas maneiras”, com seu sapatinho e vestidinho cor de rosa choque e seus pratinhos de gatinho nas paredes, faz da sala de aula e da direção, do salão de professores e da escola o seu domínio, de onde exerce seu cargo com esgares de prazer quando tortura algum aluno, ou impõe sua ordem a serviço do Lorde das Trevas. Ela própria que é o capacho de Você-Sabe-Quem, vive a espezinhar os estudantes e professores tolhendo sua liberdade de expressão, expedindo regras e regras para atender à vontade de quem a também serve, controlando tudo com sua mãozinha de ferro cor de rosa, impondo o silêncio, controlando a escola.

Os livros e filmes das peripécias de Harry Potter descrevem muito bem aquela figurinha empertigada de mãozinhas postas e pezinhos bem juntos, desde dando um falso “bom dia” cantarolado aos alunos até ser escorraçada da escola pelos próprios estudantes revoltosos com sua presença de falsa dignidade. Xingando e exigindo soltura, depois foi levada pelos centauros e, finalmente, conduzida a Askaban, a prisão guardada pelos Dementadores que chupam a energia vital das pessoas.

Nessa mesma série, Você-Sabe-Quem, o morto-vivo, malvado por excelência da literatura de ficção infanto-juvenil nunca enfrentava diretamente os personagens “do bem” e, em sua covardia, sempre mandava alguém servil a ele a fazer isso ou aquilo em troca de posição de poder ou favores em seus planos diabólicos para dominar tudo. Em todas as reuniões e encontros com seus asseclas, é aquela figura execrável que cria a pauta, fala primeiro, no meio e por último, determinando sua vontade que quer soberana acima da vontade dos outros. Coage, insinua, ameaça, chantageia, enfim, seduz os incautos e em insana consciência para servi-lo e cumprir suas vontades.

Esse “inimigo número um” da Escola de Bruxos é daqueles covardes que nunca enfrentam os que se fizeram seus opositores, jamais se coloca face a face com eles, nunca dá a cara a bater, mesmo porque não tem condições de se defender em pé de igualdade com as pessoas do “bem”.


Bruxos e bruxas assalariados pelo ”lado negro da força”, no reino da fantasia e no mundo real como mal-amados, temidos e odiados, des-carados por detrás de suas máscaras, com suas duas caras - as deles e as dos outros de que se servem - famintos de bajulação, escondendo-se sob as sombras do próprio “chapéu seletor” feito radar à procura de outros sonsos  que lhes adulem.

São essas pessoas os assediadores morais que, em sua i-moralidade ou a-moralidade, em suma, em sua falta de ética, todos um dia já tivemos a malfadada oportunidade de encontrar em meio a nossas lidas no campo da Educação, ou ler em algum romance em que os antagonistas sempre perdem, e os protagonistas sempre vencem no final. O mal tem limites, e a indignação, individual e coletiva, um dia chega para colocar a harmonia em meio ao desequilíbrio que geram.

O que fazer com elas? O que fazer por elas? O que fazer apesar delas?

Mesmo rindo melancolicamente diante de tantos fatos entristecedores, não há como não ter piedade dessas pessoas que, por serem tão histriônicas, se tornam infelizmente cômicas, confirmado isso pelos sorrisos amarelos e estupefação de muitos ante suas bobagens e idiotices faladas, vistas e ouvidas. E, na tragicidade e em todos as cenas da farsa em que vivem como mortos assombrando a vida alheia, quem quer que seja que tenha o mínimo de sentido de decência deve a essas pessoas a mais pura com-paixão, esperando que um belo dia essas pessoas possam acordar do pesadelo em que se metem, e fazem os outros se apavorar com elas, ou por elas.

No entanto, por mais que num plano de vivência de valores humanos e espirituais devamos ser com-passivos com tais criaturas infelizes e infelicitadoras, é necessário e urgente denunciá-las à comunidade escolar, desmascará-las de sua condição de tiranos e autoritários mal-disfarçados de lobos em pele de cordeiros. É preciso levar ao conhecimento da população tais fatos, fazendo isso em alto e bom tom, porque já vivemos em uma sociedade de direitos, democrática, plural em que os direitos de uns não podem ir além dos limites dos direitos dos outros.

Leis existem para proteger aqueles que são submetidos a esse tipo de força opressora e abusiva e, à aparente fragilidade de muitos que sofrem tal abuso de autoridade, podemos e devemos nos reunir em nome da solidariedade pela defesa da justiça e do Bem Viver.

Tais comportamentos já não são aceitáveis nem toleráveis por essa atual geração de crianças e jovens, e dos adultos que real e verdadeiramente lutam, trabalham e vivem por construir um mundo livre de tais situações de dominação, por uma escola livre de tais imposições, por uma Educação que se pretenda de qualidade e promova a paz entre as pessoas.

Não é de se espantar que nas histórias que parecem ser contos de ninar, ou mero entretenimento para as horas de folguedos de meninos e meninas, são as personagens infantis que sabem, e fazem a mágica transformadora de toda situação de tristeza em alegria e libertação das opressões a que foram submetidas. São as crianças, e as pessoas simples do cotidiano dos contos de fadas dos antigos e contemporâneos que sempre salvam a situação da catástrofe iminente se não se freasse o desmedido poder dos prepotentes desalmados.

Histórias que encantaram milhões e milhões de pessoas ao redor do mundo foram crianças e jovens, pais e professores dedicados de “almas claras” que só “clarividentes podem ver” que, por exemplo, se uniram co-movidos pela indignação junto a Harry Potter - menino órfão, simples, puro, de bom coração - e salvaram a todos da ganância do Lorde das Trevas em submeter uma humanidade à sua crueldade e truculência.  Belas, simples e singelas mensagens para inspirar nós outros à tomada de consciência contra as atrocidades praticadas cotidianamente sob o manto da falsa dedicação e os interesses disfarçando a auto-promoção.

As varinhas de condão de hoje são os lápis coloridos que fazem barulho ao sacolejo das mochilas carregadas alegremente para as salas de aula, e crianças e jovens nas escolas anseiam por se expressarem na plenitude de seus direitos humanos na rebeldia sumariamente sufocada pela enxurrada de afazeres sem sentido a que são compelidas a cumprir em nome de se adaptarem à sociedade adoentada que as rodeia.

Gritos estridentes de quem só sabe mandar para querer ser obedecido, e ríspidos “psius” à agitação daquilo que não pode ser jamais controlado - o sonho humano de liberdade e ventura - querem calar nas crianças e jovens o dom inato de não quererem se ajustar à uma maquinaria que tritura qualquer vontade que não siga na linha de produção escolar ou acadêmica que se consolidou como “mal necessário”.

Ainda estamos envolvidos pelos resquícios de uma época de controle da palavra, dos pensamentos e sentimentos, de uma educação moldada para criar exércitos de autômatos a silenciosa e obedientemente servirem de novos escravos de um mundo de consumismo para enriquecer uns poucos mandatários.

Pouco a pouco, aquém e além do arco-íris, outras forças poderosas se movem, novas palavras de ordem, amor e progresso humanizadores reluzem, e piscamos os olhos como que adquirindo redobrado ânimo para tudo suportar, porque a liberdade vem, ainda que tardia.

As crianças e jovens, ora melancólicos ante o infortúnio que as tenta cercear os devaneios, ora incômodas em seus barulhos e agitação nas salas de aula fechadas como prisões do pensamento, parecem nos relembrar a cada dia, hora e segundo, que é chegado o tempo de acordar dos pesadelos para a realização daquele sonho de liberdade. Se a carapuça preta serve a muitos entristecidos, também cabe a cada um que tenha coragem e boa vontade as asas de um anjo ou os chapéus dos magos e mágicos para as grandes realizações em nome do amor e da alegria.

É preciso repudiar todos os comportamentos e atitudes inadequadas, os ab-surdos, ab-mudos e ab-cegos que se veem, falam e se ouvem no mundo real das malvadezas des-humanas, em devido respeito que devemos à infância e juventude e, seus direitos inalienáveis garantidos em documentos forjados pela luta de muitos. Isso requer de todos nós uma responsabilidade extraordinária para que cada um saiba separar o que é justo e injusto quando devemos ser firmes nas atitudes de encorajamento para a realização de seus sonhos, sem jamais perder a ternura para com eles. Os contos de fadas desde sempre nos inspiram a isso...

As Escolas e a Educação precisam se libertar do assédio moral que se dissemina feito praga, precisam ser libertadas de seus carrascos, precisam se re-construir de seus escombros, precisam renascer de suas cinzas pelos mesmos feitos daqueles  indignados e de boa vontade reunidos em torno da "Ordem da Fênix"**. Que as Escolas e a Educação sejam re-en-cantadas pelo Poder da Alegria e do Amor, e da Sabedoria de todos.

O assédio moral nas escolas é tema incômodo, que abala estruturas carcomidas, mas fortes o bastante para se manterem e se quererem impunes.  Faz-se urgente o debate em todas as rodas e fóruns de discussão, em todos os diálogos nas ruas, nas casas, nas universidades, nos gabinetes das autoridades públicas, nas mídias, nas redes sociais, nos espaços da luta política, nas delegacias e boletins de ocorrência, nos camburões e locais de tratamento ou correção a tal tipo de abuso, assim como nas salas de aula, nas salas de professores, nos corredores e em todos os cantos de nossas instituições escolares.

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* Leorry Reportter é (Tele)Jornalista Escolar, ex-aluno e estagiário de escolas místicas e lendárias nos quatro cantos do mundo, também esteve em Hogwarts colaborando com as mídias piratas que faziam a comunicação popular e libertária nos tempos da censura e ditadura do Vocês-Sabem-Quem. Escreve para o “Novo Profeta Diário”, e atua como correspondente de vários periódicos do mundo da realização dos Sonhos das Estrelas,  dos Anjos,  das Fadas, dos Loucos e dos Palhaços da Alegria, dos Magos do Bem e dos Mágicos por uma Escola da mais pura Imaginação.

Personagem in-vestido e apresentado por Leo Nogueira Paqonawta.

** "Harry Potter e a Ordem da Fênix", quinto livro da saga do bruxo de Hogwarts, de autoria de J.K. Rowling. O filme baseado nessa obra estreou em 2006/2007, produção de Heyday Films e distribuição de Warner Bros. Pictures.

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