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quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Infância Livre de Consumismo: 12 razões para regular a publicidade infantil


12 razões para regular a publicidade infantil

Texto de Mariana Sá*

O PL 5921/01, que propõe uma nova regulação da publicidade para crianças, fará 12 anos de tramitação no dia 12/12. Por isso, selecionamos 12 razões pelas quais acreditamos que a publicidade infantil deva ser regulada:

1. Não há justificativa moral, ética ou social para usar as crianças como alvo da publicidade.

A única justificativa é econômica: dirigindo comunicação mercadológica para crianças, vende-se mais. Numa sociedade que prioriza o pleno desenvolvimento infantil, os negócios não podem estar acima das necessidades singulares da infância. E, sim, o Brasil é um país que – em tese, na lei – prioriza a crianças e esta prioridade deveria estar sempre sendo dada na feitura de novas leis e de novas políticas públicas, inclusive nas políticas econômicas e de comunicação.

2. As empresas têm acesso a tecnologias avançadas de marketing.

Pesquisas de mercado, grupos de observação de comportamento do consumidor, avançados estudos sobre a psicologia: tudo servindo à missão de aumentar os resultados de imagem, venda e lucro das empresas. E custe o que custar, mesmo que o custo seja reproduzir preconceitos e fragilizar ainda mais o indivíduo. As crianças, por sua própria inocência, são muito mais susceptíveis e indefesas diante dos marqueteiros e publicitários.

3. O córtex frontal, responsável pelo julgamento crítico, só termina de se desenvolver em torno dos 20 anos de idade.

Esta região cerebral está relacionada ao planejamento de comportamentos e pensamentos complexos, expressão da personalidade, tomadas de decisões e modulação de comportamento social. A atividade básica dessa região é resultado de pensamentos e ações em acordo com metas internas. A função psicológica mais importante relacionada ao córtex pré-frontal é a função executiva. Esta função se relaciona a habilidades para diferenciar pensamentos conflitantes, determinar o bom ou ruim, melhor e pior, igual e diferente, consequências futuras de atividades correntes, trabalho em relação a uma meta definida, previsão de fatos, expectativas baseadas em ações e controle social. Muitos autores indicam uma ligação entre a personalidade de uma pessoa e funcionamento do córtex pré-frontal. Wikipedia

4. Até os 12 anos, a criança não tem condições de compreender as artimanhas da publicidade.

É nesta idade, em média, que o sujeito inicia o desenvolvimento dos mecanismos internos capazes de compreender as diversas sutilezas e interpretar criticamente o sofisticado discurso publicitário. Antes de 12 anos, a criança não possui condições de se defender dos instrumentos usados pela influente indústria publicitária.

5. Um lobby poderoso impede a regulamentação da publicidade para crianças.

Um conjunto de representantes de anunciantes, de agências de publicidade e de emissoras de radiodifusão, e até mesmo artistas renomados do entretenimento infanto-juvenil, tem trabalhado intensamente nos bastidores do Congresso Nacional para atrasar a tramitação do PL 5921/01 que há doze anos é debatido e ganha substitutivos no parlamento. Eles sabem que seus lucros despencarão se o PL resultar na proibição da publicidade infantil ou mesmo numa regulamentação que envolva multa e contrapropaganda, uma vez que não terão liberdade para dirigir seu discurso para a criança, transformando-a em representante de vendas de seus produtos.

6. Os países com menos publicidade voltada para crianças são os mais desenvolvidos em termos de bem-estar infantil.

Vende mais porque é fresquinho ou é fresquinho porque vende mais? O país que proíbe a publicidade infantil tem bons índices de bem-estar infantil ou tem bons índices de bem-estar infantil porque proíbe a publicidade infantil? Nós não sabemos o que vem antes, mas a constatação é que os dois fatores estão ligados: o país que se preocupa com as suas crianças não dá tanta liberdade aos anunciantes.

7. O neuromarketing utiliza tecnologia médica para estudar como o marketing afeta as crianças.

Segundo a wikipedia, o “neuromarketing é a união do marketing com a ciência, visa o entendimento da lógica de consumo: entender os desejos, impulsos e motivações das pessoas, através do estudo das reações neurológicas a determinados estímulos externos. Um dos principais fatos descoberto pelos neurologistas explica que a maior parte de todas as decisões de compra são tomadas em nível subconsciente e que, sendo assim, é importante impactar o inconsciente do consumidor com memórias, emoções e experiências positivas. Dessa forma, o consumidor se lembrará de uma marca ou de um produto de forma mais facilitada na hora de escolher qual produto adicionar ao carrinho.”

Esta breve descrição de internet basta para entender por que é imoral pesquisar usando crianças ou aplicar o neuromarketing em comunicações dirigidas a elas.

8. Crianças que sofrem bombardeio constante de estímulos publicitários ficam tão ocupadas em reagir que nunca aprender a criar.

“O universo onírico, dos sonhos e das brincadeiras, é essencial para a saúde psíquica da criança. Por meio da fantasia, ela consegue transportar o mundo adulto à sua vivência infantil de forma criativa. as crianças das gerações atuais não são mais criadoras das fantasias que vivenciam, mas as recebem da televisão e da internet, num processo que praticamente elimina o contato e a convivência com amigos e impede aos pequenos se educar nos códigos da sociabilidade, como saber admitir seus próprios limites e reconhecer o direito dos outros”. Frei Beto

9. É imoral, é ilegal e engorda.

Deixar um PhD em marketing conversar com uma criança sem supervisão dos pais é como permitir que um pedófilo gerencie um orfanato, é imoral. A legislação brasileira, nos seus princípios enuncia prioridade e a hipervulnerabilidade das crianças: é ilegal (sim, já é ilegal!). A publicidade anuncia alimentos calóricos e pouco nutritivos, o marketing coloca personagens queridos para estampar embalagens de porcarias: engorda!

10. Não é sustentável.

Ora! Se a publicidade estimula a compra do que não é necessidade ou desejo de fato, a publicidade estimula o consumo de recursos do planeta para produzir mais do que o que precisamos e o descarte de tudo aquilo que compramos e jogamos fora. Se a publicidade se dirige às crianças, o consumo é muito maior e o descarte mais intenso. Publicidade infantil e sustentabilidade não têm nada a ver uma com a outra.

11. Se aproveita da ausência dos adultos, distorce valores e gera estresse familiar.

Sempre que se fala em proibir a publicidade não falta quem diga que os pais precisam dizer “não!” e explicar para os filhos as artimanhas do discurso publicitário. O fato é que no Brasil, este país pobre que se contorce e não consegue promover uma infância decente para mais da metade das crianças, este é um sofisma, porque simplesmente os adultos não têm recursos (informacionais ou de tempo) para explicar coisa nenhuma sobre discurso publicitário ou mesmo para estar com os filhos enquanto assistem tevê. Proibir a publicidade ou regulamentá-la de maneira mais eficiente significa proteger os mais vulneráveis.

12. A autorregulamentação não tem sido eficiente no Brasil.

As denúncias demoram de dois a três meses para serem apreciadas e a maior parte das sentenças determina que a campanha seja alterada ou tirada do ar. Os anunciantes não pagam multa nem são obrigados a se retratar. Quando, finalmente a campanha sai do ar, já fez grandes estragos no desenvolvimento das crianças que ficaram expostas.


Inspiração para o post: anotações de Silvia Düssel Schiros durante a palesta de Susan Linn para o Projeto Criança e Consumo.

* Mariana é publicitária e mestra em políticas públicas. É mãe de dois e escreve no blog Viciados em colo. Co-fundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo.

02 dez 2013

Publicidade infantil não! Ajude com um e-mail clicando aqui.



domingo, 1 de julho de 2012

O que está em jogo sobre a publicidade infantil no Brasil


O que está em jogo sobre a publicidade infantil no Brasil

Por Mariana Sá, com coleboração de Tais Vinha e Ivana Luckesi

Entenda porque vivemos um momento singular e decisivo para as entidades de proteção à infância e porque o mercado publicitário se esforça por influenciar a opinião pública sobre a não necessidade de novas leis que regulem a publicidade infantil. Queremos compartilhar o que aprendemos sobre o que precisa ser feito por nós para uma Infância Livre de Consumismo.

Como é hoje?

Além do Código Brasileiro deAuto-Regulamentação Publicitária – CBARP existem mais três diplomas normativos que oferecem proteção à criança e ratificam a sua situação única de indivíduo em fase de formação, reconhecendo-a com mais vulnerável que os adultos em relação à publicidade e propaganda. São elas: a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente o Código de Defesa do Consumidor.

Todo o marco legal que busca coibir os abusos em relação à comunicação tem como base princípios éticos e regras gerais, que não são obedecidos por muitos anunciantes, especialmente porque o principal dispositivo legal que regula exatamente as mensagens mercadológicas dirigidas às crianças é um Código de Ética e não tem força de lei.

Por não ter força de lei, o CBARP pode apenas recomendar a suspensão da campanha, nada mais. Além disso, os anunciantes interpretam estes princípios de acordo com seus interesses mercantis, dando pouca ou nenhuma importância à possibilidade de causar prejuízos às crianças brasileiras.

Que Projeto de Lei é esse de que tanto falamos?

Projeto de Lei (PL) 5.921, foi apresentado em 2001, pelo Deputado Luiz Carlos Hauly, com a intenção de inserir um novo texto no Código de Defesa do Consumidor. A proposta original era proibir a publicidade de produtos infantis.

Este PL passou então pela Comissão de Defesa do Consumidor (CDC) da Câmara. A relatora, Deputada Maria do Carmo Lara, apresentou um texto substitutivo e foi aprovado.

O grande ganho desse texto é que ele compreendeu que apenas restringir a publicidade dos produtos infantis não resolveria o problema, uma vez que a publicidade de produtos adultos também é direcionada para as crianças. E não haveria motivos para restringir a comunicação se o produto infantil fosse anunciado aos pais. É um texto bastante completo, que define o que é uma mensagem dirigida às crianças e inclui punições. Apesar da aprovação da CDC, foi considerado extremamente radical pelo mercado.

O PL da relatora Maria do Carmo Lara foi encaminhado para a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria eComércio (CDEIC). Lá, o relator, deputado Osório Adriano, apresentou um novo substitutivo. Esse novo texto retorna às intenções do PL original e apenas redefine genericamente o que é uma mensagem considerada abusiva, dentro do artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor, sem inclusão de nenhuma penalidade para o descumprimento. O texto do deputado é aprovado pela CDEIC em 2009 e encaminhado para a Comissão de Ciência, Tecnologia,Comunicação e Informática (CCTCI) onde está até agora.

Em 2010, deputado Bilac Pinto, então relator do PL 9521/2001, apresentou um novo substitutivo, que representa um meio termo, uma espécie de negociação entre o mercado e o movimento social. Não atende exatamente às demandas da sociedade civil, mas também não agrada ao mercado. Mesmo assim, consideramos o conteúdo um avanço na questão da proteção à infância, tendo mais viabilidade para ser aprovado, do que o primeiro substitutivo.

Contudo, em 2010, o parlamentar não foi reeleito e este texto se perdeu. Agora, o novo relator da CCTCI, o Deputado Federal Salvador Zimbaldi, poderá ou não apresentar um novo texto, aproveitando ou não elementos desse texto do deputado Bilac Pinto ou dos anteriores.

Após análise e aprovação na CCTCI, o PL passará pela Comissão de Constituição e Justiça, que avaliará a constitucionalidade do texto.

Aqui há um fator importante: a CCJ normalmente trabalha em cima do texto aprovado na última comissão. Por isso, este texto da CCTCI que está em aberto é tão importante.

Por este motivo, o mercado publicitário se interessa por influenciar a opinião pública sobre a responsabilidade exclusiva da família em mediar o consumo de mídia junto aos filhos e tentar incutir entre nós, pais e mães, os argumentos sobre a tutela estatal sobre as famílias, a censura da livre expressão comercial e a inviabilidade econômica da programação infantil.

Por isso, precisamos lutar para que esse texto contemple a proteção da infância.

Porque gostamos deste texto perdido?

Primeiro porque o texto Bilac Pinto está em perfeita harmonia com os demais diplomas de proteção à infância e ao consumidor (CF, ECA e CDC), em prevendo a aplicação subsidiária desses dois diplomas no seu artigo 10. Isto interessa especialmente a pais, mães e cidadãos preocupados com o futuro.

Além disso, o texto é objetivo; declara, de cara, a vulnerabilidade das crianças e adolescentes, chamando a atenção para que essa questão seja considerada (art. 2º); define, claramente, a propaganda comercial que pode ser nociva à saúde física e mental de crianças e adolescentes (art. 3º); caracteriza o que é a “propaganda comercial dirigida majoritariamente a crianças e adolescentes”, trazendo hipóteses amplas (o que é bom, porque fecha o cerco) e exigindo a presença de apenas uma delas para configurar esse tipo de propaganda.

Estamos convencidos que a aprovação de uma Lei com um conteúdo como este vai ampliar as possibilidades de controle, porque quem vai fiscalizar o cumprimento da lei e aplicar as sanções administrativas serão os órgãos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, a exemplo dos PROCONs, que seria a autoridade responsável pelo processo administrativo correspondente  e não um Tribunal de Ética composto, em sua maioria, pelos maiores interessados no incentivo ao consumo.

Vai facilitar, também, a fiscalização pela sociedade, porque será muito mais fácil denunciar perante um órgão que já se conhece e se confia, de amplo acesso ao consumidor, sem embargo das possibilidades de discussão pelo Ministério Público e da apreciação pelo Poder Judiciário.

O aprendemos neste mês de militância?

Na longa jornada que um projeto de lei percorre até ser ou não votado, as comissões tem autonomia para modificar ou substituir os textos, sem necessariamente aproveitar os relatos das comissões anteriores. Por exemplo, o texto da deputada Maria do Carmo Lara pode ser completamente esquecido se nenhum deputado resolver puxar elementos dele na última comissão. Como este texto que gostamos não está em jogo, a prioridade agora é colocá-lo de volta na mesa. Tudo depende da influência que o mercado publicitário, as entidades de proteção à infância e, principalmente, a opinião pública possam exercer sobre os congressistas. Atenção: a opinião pública somos nós!

No nosso ponto de vista existem quatro prioridades:

A primeira é assumirmos que a autorregulação nos moldes atuais não funciona. E o controle da publicidade infantil passe a ser de toda sociedade e não apenas de publicitários e anunciantes.

A segunda é que a restrição seja em relação ao público-alvo da mensagem. Assim, a comunicação dos produtos, independente de serem infantis, deverá ser direcionada aos adultos responsáveis pela compra e não aos pequenos, não prejudicando assim a cadeia produtiva ou o mercado publicitário.

A terceira é que sejam criadas regras mais explícitas que as atuais. Por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor prevê que a publicidade que se aproveita da ingenuidade da criança pode ser considerada ilegal. No entanto, não fica claro o que significa “se aproveitar da ingenuidade da criança” e isso dá margem a diversas interpretações.

A quarta é estabelecermos punições rigorosas para anunciantes, agências de propaganda e veículos que desobedecerem a Lei. A contrapropaganda (veiculação de mensagem que repare a comunicação inadequada, na mesma frequência, nos mesmos programas e com o mesmo investimento feito anteriormente) é uma boa penalidade, pois a reparação é proporcional ao dano.

Proteger a infância é dever não apenas dos pais, mas de toda a sociedade.

Tutela significa proteção. O maior argumento dos publicitários é que a aprovação de uma lei como esta significaria admitir que o Estado é quem tutela as crianças. Pois sim! Nesse sentido, consideramos que proteger a criança é papel, também, do Estado. E cabe a este, ainda, a tutela administrativa das relações de consumo, no sentido de fazer valer as regras de proteção ao consumidor (e aqui seriam alcançados os publicitários, as empresas, fornecedores, veículos etc.).

Não é tampouco, uma tentativa de censura: limites para a liberdade de expressão comercial de produtos lícitos já existem para outros setores que reconhecidamente causam prejuízos à sociedade. A liberdade de expressão comercial não pode e não deve ser confundida com liberdade de expressão e com o livre pensamento, estes sim inalienáveis!

É natural que o mercado não queira interferências, afinal o setor infantil vale bilhões. Mas a causa que nós, pais e mães, defendemos é ainda mais valiosa: a dignidade e o futuro dos nossos filhos.

Nós, mães e pais, temos o direito soberano de educar nossos filhos, sem que nossos valores tenham que competir, muitas vezes em desigualdade, com os valores sedutores das mensagens publicitárias. Queremos mais equilíbrio nessa relação.

Nós, mães e pais, temos também o direito de participar de qualquer discussão que envolva nossas crianças, sem que nossa opinião seja minimizada, ridicularizada ou desmerecida.

Nossa missão é acompanhar de perto os caminhos do PL 5921/2001, aprender mais sobre publicidade infantil, compartilhar experiências e desmistificar as bravatas feitas por quem quer que seja, nem que isso leve mais dez anos.

(*) Mariana Sá é publicitária, mãe e escreve no blog viciados em colo, Tais Vinha é mãe e escreve no blog Ombusdsmãe, e Ivana Luckesi, é advogada, mãe e escreve no blog Coisa de Mãe. As três são colaboradoras da Comunidade Infância Livre de Consumismo.

05 mai 2012