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domingo, 25 de março de 2012

Autorregulamentação não exclui controle público e social


Autorregulamentação não exclui controle público e social

Valério Cruz Brittos e Luciano Gallas
Para o Observatório da Imprensa
19.03.2012

O conceito de autorregulamentação voltou à cena nos últimos meses, a partir da pressão social em torno da necessidade de implementação de um marco regulatório para as comunicações. Agora, no momento em que o Ministério das Comunicações anuncia que colocará em consulta pública a proposta regulatória que estava engavetada, fica claro que o empresariado quer é evitar a todo custo qualquer iniciativa de fiscalização às suas atividades.

Desde 1978, existe o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), com a prerrogativa de barrar campanhas consideradas agressivas aos direitos do consumidor ou ao próprio mercado. Também a Associação Nacional de Jornais (ANJ) aprovou, em 2011, a criação de um conselho de autorregulamentação para a área do jornalismo gráfico. Iniciativas deste tipo são bem-vindas, mas demonstram antes uma reação do mercado à incipiente mobilização da sociedade civil (e ao ensaio do poder público em criar estruturas de fiscalização dos meios) do que um efetivo interesse em qualificar a comunicação oferecida à população.

A tese de que entidades de classe são capazes de fazer com que as empresas representadas sigam normas e condutas éticas comuns é discutível. Fundado pelas associaçõesbrasileiras de Anunciantes (ABA), de Agências de Publicidade (Abap) e de Emissoras de Rádio e TV (Abert), além da própria ANJ, o Conar é um exemplo disso: uma olhada nas campanhas publicitárias exibidas na mídia resultará em vários apontamentos sobre comerciais que poderiam ser questionados por desrespeito às diversidades de gênero, etnia, credo, gerações e orientação sexual. Portanto, há uma certa distância entre a orientação do Conar e os valores éticos empregados na produção destas campanhas.

A supremacia do privado sobre o público

Nem sempre a opinião do mercado coincide com a posição do consumidor e com a avaliação do cidadão. Além do mais, a implementação de medidas de autorregulamentação não exclui iniciativas de controle público e social sobre os meios de comunicação. Também não inibe a necessidade de mecanismos legais capazes de colocar obstáculos à concentração de propriedade de emissoras de rádio e de televisão, jornais e revistas, portais e sítios eletrônicos por uma mesma companhia de comunicação. Assim como não elimina a necessidade de que as emissoras contempladas com concessões deem conta da pluralidade cultural da sociedade brasileira na programação e promovam a descentralização da produção.

Desta forma, a autorregulamentação é apenas uma das medidas passíveis de serem adotadas na defesa do direito à comunicação. Se o pleito é alcançar uma comunicação mais democrática e inclusiva, a autorregulamentação não resolve. As emissoras de rádio e de TV operam mediante concessão pública, faturando com campanhas publicitárias e merchandising que ocupam o espaço público do espectro radioelétrico. Uma atividade com estas características deve estar disponível a prestar contas ao público, o que é diferente de negociar regras entre os pares, mesmo que essas normas tenham algum nível de resultado social positivo.

Uma regulamentação construída a partir do mercado será necessariamente submissa aos interesses do capital. Uma empresa é planejada para gerar dividendos, ao que deve estar adequado todo ordenamento que tenha origem nela. Os valores destas regras obedecerão à lógica de supremacia do privado sobre o público. Em consequência, a regulamentação pelo mercado não basta por si, devendo a sociedade civil assumir sua prerrogativa de fiscalização sobre os meios de comunicação, por mais bem intencionados que sejam seus dirigentes.

Valério Cruz Brittos e Luciano Gallas são, respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos; e mestrando no mesmo programa e associado ao coletivo de comunicação Intervozes

Via Vilson Vieira Júnior . Mídia Aberta

Leia também:

“Dos monopólios à democratização: caminhos e lutas por uma outra  comunicação no Brasil”, monografia por Vilson Vieira Júnior, clicando aqui.

“Autorregulamentação e liberdade de expressão, a receita do Conar”, clicando aqui.

domingo, 11 de dezembro de 2011

Capitalismo, TICs e consumismo de mãos dadas: o futuro já começou nessa festa


Capitalismo, TICs e consumismo

Por Valério Cruz Brittos e Jéssica M. G. Finger
06/12/2011 na edição 671

O capitalismo sustenta-se no fomento incessante ao consumismo, acelerando a acumulação por uma parte da sociedade. Trata-se de um modelo em que a necessidade de consumo é explorada de forma sempre crescente, a fim de manter o melhor desempenho de seus agentes constituintes com o máximo de retorno e, desta forma, funcionando o todo social. Os esforços para estimular uma sociedade movida pelo consumo crescem de maneira gradativa, com publicitários, especialistas em marketing, executivos em geral e empresários ocupando-se em trazer soluções de consumo para a nova massa que surge, ao mesmo tempo em que cria atrativos para os segmentos já integrados, provocando a inovação permanente.

Para tanto, as tecnologias de informação e comunicação (TICs) são grandes aliadas. Elas possibilitam o desenvolvimento de produtos cada vez mais bem elaborados e portadores de funções facilitadoras, gerando na sequência novas necessidades e o must buy. O celular e a internet são exemplos já incorporados ao cotidiano e ao modo de vida dos cidadãos, agindo, inclusive, como agentes transformadores das relações sócio-econômico-culturais. Explora-se, com o estímulo a novas necessidades, o desejo de se estar dentro do circuito do mais novo, melhor e mais funcional dos mundos, incentivando a constante renovação dos dispositivos tecnológicos. É o ciclo do consumo sem fim, onde a obsolescência forçada é fundamental.

O enigma da superação

A tecnologia tem um papel essencial na facilitação do consumo, estimulando a compra impulsiva e desnecessária, desta forma beneficiando corporações e dando força à orientação econômica vigente. Nesse quadro inserem-se as lojas online, acessíveis sem sair de casa através de mecanismos que permitem o pagamento por esses produtos de forma rápida e segura com alguns cliques de mouse e via cartão de crédito (na maioria das vezes com juros elevados pela não quitação integral do débito, gerando endividamento elevado e contínuo). Dentro de algum tempo, a TV digital trará a possibilidade de comprar produtos de comerciais com o próprio controle remoto, pois tudo estará interligado, se definido o canal de retorno.

Circula na internet o vídeo We Are the Future (Nós Somos o Futuro, disponível aqui), em que adolescentes na faixa de 13 anos argumentam que os profissionais de marketing devem rever a maneira de fazer comunicação. A justificativa é que a massa consumista está crescendo de tal modo que o futuro das marcas será por ela determinada. Comentam sobre os formadores de opinião, salientando ser necessário que as empresas paguem esses consumidores alfas, pois sua atitude influenciará diretamente os padrões de compra generalizados, o que reforça a ideia de que todos cada vez mais trabalham pelas marcas, gratuitamente, como se isto fosse inclusão.

Sendo o consumo a base da economia capitalista, de produção e demanda, de compra e venda, os profissionais responsáveis pela criação de uma condição favorável à aceleração da circulação estão cada vez mais atentos, ousados e valorizados. Suas investidas criam situações não raro inimagináveis, sempre procurando favorecer a circulação de mercadoria e capital. A pergunta que fica no ar é até quando tudo isso será sustentável. Chegará o dia em que o próprio ser humano será colocado para comercialização como um bem de consumo? Ou esse dia já chegou, sem que nem fosse percebido? Tudo isso denota a existência de um sistema que, longe de ser autossustentável, traz o enigma de sua superação na sua própria concepção.

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Valério Cruz Brittos e Jéssica M. G. Finger são, respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e graduanda em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda na mesma instituição.


Comentário de Filosomídia:

Capitalismo, TICs e consumismo de mãos dadas: o futuro já começou nessa festa


Nessa festa onde o deus mercado é venerado acima de todas as coisas em coisificando tudo, e as empresas que controlam e manipulam a informação no mundo neoglobalizado propagandeiam incessantemente que consumir é a razão de nossa existência.

O vídeo em questão no artigo, onde aparecem os adolescentes descoladinhos, os bacanas da "Idade Mídia" dando dicas aos publicitários e marketeiros sobre o que dizer a elas, como e por quê, demonstra bem que o futuro já está sendo planejado pelo mercado há muitos anos. Crianças e adolescentes hoje em dia, imersos no mundo das teclas e telas recebendo estímulos de toda parte para consumir, vão se formatando pelos meios de comunicação concentrado nas mãos do oligopólio a la Murdoch, assim como de modo geral nas escolas vão se formando essas novas gerações, a la Maquiavel.

Os professores estão colaborando para essa alienação toda quando não são críticos ou estão passivos frente à realidade diante de seus olhos, e as crianças debaixo de seu nariz, de seu controle. O sistema de ensino se edifica sob os mesmos princípios do capitalismo, focando no individualismo, na meritocracia, na competição que faz a des-humanização de todos, centrado no des-amor, na não-liberdade e cassando a autonomia e a palavra dos estudantes.

No Brasil temos uma situação peculiar, mas bem ao gosto do mercado: a educação é completamente regulada por mil mecanismos que controlam tudo, desde o conteúdo e programas de ensino, livros didáticos e literatura infanto-juvenil, até as ações do professor dentro de sala de aula. E, pouco a pouco vemos a privatização do ensino, e a mercantilização da educação.

Oposto a isso, o setor de comunicações é completamente desregulado, permitindo que as grandes empresas de comunicação - privadas - façam o que bem entendem, respaldadas pela legislação adequadamente conformada às suas prioridades no controle da informação.

Na programação das TVs fica claro que mundo cor de rosa dessa democracia do capitalismo do Velho (Europa) e do Novo Mundo (América do Norte) é o melhor para todos. Impossível não perceber nos telejornais, por exemplo, como os fatos são manipulados, como as notícias são construídas, e como se apresentam estas com requintes tecnicamente elaborados para persuadir o telespectador ao exercício de seu direito de consumir, e dever de viver segundo as regras ditadas pelo deus venerado do mercado. Tal fenômeno se reproduz na imprensa escrita e na Internet. A "dieta informacional" do dia é sugerida pela pauta e cardápio preparado nas redações e pelas agências de notícias ao redor do mundo...

Outro exemplo, reparemos em como as crianças se vestem para ir à aula, seus tênis e camisetas, em como são seus cadernos, lápis, canetas, estojos, os filmes e desenhos a que assistem na TV ou cinema. Um desfile do mundo fabricado pelas empresas de comunicação auferindo lucros nos produtos licenciados, que a meninada carrega feliz, vivendo bem a vida do mundo de ilusória fantasia do capitalismo. Ensinadas desde cedo a venerarem aquele deus do des-amor, logo logo o sistema bancário lhes proverá cartões de crédito vinculados aos dos pais ou (i)responsáveis e, assim, por elas mesmas comprarem sem interferência o que lhes deixam felizes.

Capitalismo, TICs, consumismo, classificação indicativa e tantos outros pontos são importantes para a discussão e crítica nas escolas, nos cursos de formação de professores, e especialmente entre a comunidade acadêmica que muitas das vezes se faz alheia ao que se passa pelas maquiavelices murdochianas, em nome de não ser a "redentora da humanidade". Certamente que não são, pois por não terem dinheiro propriamente dito, na mesma lógica do sistema são os auto-proclamados detentores e defensores do "capital cultural". Além do que, no princípio de todas as coisificações, muitos professores universitários são os que legitimam esse pesadelo da realidade com ares de ciência, e seguem de (a)consciência tranquila do dever cumprido quando detêm os meios de impedir a comunicação dos fatos, de que a liberdade e o amor sejam ditos.

Neste mundo que vai elogiando tudo isso como democrático, enquanto a maioria da sociedade vive das migalhas dos ricos e em frangalhos, sem direitos fundamentais sendo protegidos pelo Estado, nessa sociedade de coisificação de tudo e todos quem é que vai, enfim, nos livrar dos efetivamente bandidos e malfeitores?


Quando o próprio Estado é omisso, os governos são (i)responsáveis e os demais poderes se fazem coniventemente cegos, espertamente surdos e convenientemente mudos na proteção dos direitos das crianças e adolescentes, qual super herói virá nos salvar dessa orgia/bacanal do consumismo quando na Educação e Comunicação pela televisão mais assistida e sintonizada cantarolamos juntos que a festa é para todos, que "a festa de quem vier"?

Ou os verdadeiros super-homens e super-mulheres já estão por aí, pelas ruas, causando "tumulto" pelas mudanças e as fazendo pouco a pouco na "rexistência" pela vida com dignidade, pelo Bem Viver, ou o capitalismo mesmo cumprirá as profecias sobre o fim do mundo, enquanto carrega no seu seio tudo e todo mundo para a destruição do próprio planeta.


Nessa festa do capitalismo já vamos todos convidados e bêbedos consumidores dançando o hit do momento. Mas, para a festa no céu da dignidade, como naquela história do sapo que foi escondido no violão do urubu, somos quase todos como ele mesmo e, ficamos de fora. Tem-se de ter asas e muito amor pela vida e na vida para ouvir e entender as estrelas...

Aguardem a divulgação da dissertação "Telejornais e crianças no Brasil: a ponta do iceberg" filosmidiando sobre o "Efeito Orson Welles" e a "Síndrome de Clodovil"... o "Efeito Abya Yala" e a "Síndrome da Liberdade", convocando pelo "Manifesto das crianças" a que todos nos unamos para o Bem Viver.


Leo Nogueira

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Imprensa é dinheiro...


Jornalismo & Sensacionalismo

A informação que vende

Por Valério Cruz Brittos e Éderson Silva em 04/10/2011 na edição 662

Desde que a informação, a matéria-prima do jornalismo, passou a ser concebida como um produto e como tal priorizada para venda, o ato de informar seguiu um caminho perigoso e conflitante. A fidelidade aos fatos e à ética foi distorcida em nome de uma matéria espetacular para a apreciação e o consumo do maior número de receptores possível. Inseridas no contexto capitalista, as empresas de comunicação têm uma visão mercantilista da informação, que deve agregar a maior parte do público a que se destina para obter os melhores preços na vendagem do produto em si ou de sua publicidade.

O sensacionalismo é utilizado cada vez mais como recurso estratégico nesta Fase da Multiplicidade da Oferta em que os agentes comunicacionais têm que captar a atenção do público rapidamente, ante o acirramento da concorrência. Esta capacidade de agregar públicos faz com que o sensacionalismo seja utilizado, inclusive, como ação de programação para conquistar público localmente, como, no mercado televisivo, fazem Band e Record com a edição regional do Brasil Urgente e o Balanço Geral, respectivamente, ou como procedem organizações jornalísticas de vários estados brasileiros, com jornais para públicos C, D e E.

Nos projetos sensacionalistas, a notícia deve ser conduzida a um extremo, ocorrendo a exacerbação dos fatos incessantemente com detalhes minuciosos a fim de chocar ou emocionar o público. Estes casos ocorrem principalmente em sequestros, estupros, crimes hediondos, assaltos e outros acontecimentosfortes, em que há uma máscara de jornalismo popular, com seus protagonistas sendo proclamados representantes do povo. São mostrados como figuras paternalistas, defensoras dos mais fracos, mas se enriquecem da desgraça e do sofrimento alheio, vendendo uma imagem ilusória de salvação para os problemas sociais.

Questão ética, ponto crucial

Diariamente, grande parte da mídia utiliza-se do sensacionalismo para esquentar a notícia, permitindo sérios questionamentos éticos. Assim, o sensacional é mostrado de forma chocante e cruel ao telespectador e ao leitor. Os programas policiais utilizam-se muito desta forma de violência gratuita para noticiar os acontecimentos diários, quando são violados os direitos do cidadão. Forma-se um verdadeiro “circo midiático” em torno de um dado acontecimento, que toma proporções gigantescas, não raro desenrolando-se em vários capítulos, como uma novela, pronta para a venda em larga escala. Este tipo de jornalismo não distingue o que é informação relevante da que não é, e sim, a que vende e a que não vende.

O Código de Ética dos jornalistas brasileiros menciona que o profissional da área deve combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial quando exercidas com o objetivo de controlar a informação. Deve haver respeito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão, o que não ocorre quando se trata de explorar a notícia pelo seu ângulo sensacional. Paradoxalmente, quanto mais o sensacionalismo é utilizado, mais é lançado o argumento de que o jornalismo não deve ser regulado porque, por si próprio, teria um caráter de serviço público, mesmo quando exercido no âmbito de instituições mercadológicas.

A atividade jornalística visa à pluralidade, na sua gênese estando ligada a interesses mais amplos, já a exploração de imagens com o objetivo de chocar as pessoas remete a objetivos privados, relacionados ao lucro, preferencialmente. No código da profissão está claro, em seu artigo 11, dentre outros pontos, que o jornalista não pode divulgar informações visando ao interesse pessoal ou buscando vantagem econômica; nem que contenham caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes. Questiona-se até que ponto grande parte dos conteúdos jornalísticos atuais passa por este confronto nas diversas mídias que atravessam a sociabilidade contemporânea.

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[Valério Cruz Brittos e Éderson Silva são, respectivamente, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e graduando do Curso de Comunicação Social – Jornalismo da mesma instituição]