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segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Dia das Crianças e Movimento Infância Livre de Consumismo: "Somos o que defendemos"


Somos o que defendemos

Ligia Moreiras Sena*

Durante todo o ano, o pessoal do Movimento Infância Livre de Consumismo dedica seu tempo e seu esforço a algo que, na verdade, todos nós precisávamos estar fazendo, pelo menos nós que reconhecemos a infância como fase fundamental na formação de um ser humano íntegro e saudável: proteger as crianças dos efeitos nefastos do consumo, evitar que as crianças sejam vistas como peças de manobra no jogo injusto do consumismo.

São mulheres que poderiam dedicar o tempo que dedicam à causa às suas questões estritamente particulares, mas fizeram uma escolha que ultrapassa os limites de suas casas e que se baseia em uma coisa muito simples: no fato de que se uma criança pode e merece ser protegida, então todas podem e merecem. Não faz sentido algum protegermos nossos filhos dos ataques publicitários – que são, na verdade, uma das expressões de outros tipos de ataques, tão ou mais danosos – enquanto seus amiguinhos e amiguinhas continuam a ser massacrados todos os dias pelos apelos do consumo.

Muita gente acha que isso é uma grande bobagem. E não é raro ver pessoas que detêm espaços amplos de divulgação desperdiçarem a grande oportunidade de contribuírem para o bem coletivo e substitui-la pelo discurso senso-comum que, muito claramente, serve somente para atrair ainda mais gente, geralmente pessoas imersas no senso-comum, vivendo vidas senso-comum, numa sociedade senso-comum, moldada pelo capitalismo massacrante senso-comum.

Nós vivemos em um mundo capitalista. Embora eu não tenha iPhone, iPad, tablets e outras tecnologias, escrevo agora do meu computador, que foi comprado. Visto uma roupa que foi comprada. Meu café está agora em uma caneca que foi, também, comprada. Mas viver em um mundo capitalista não significa ser moldado e domado por ele. Não significa tornar seus os valores de consumo que delineiam as relações de consumo. Relações humanas não podem ser interpretadas como relações de consumo.

E é aí onde muitas pessoas se perdem: na confusão entre valores de consumo e valores humanos. Entre valores de consumo e valores individuais. E a prova cabal disso é que nos tornamos pessoas que acreditam que amor, integridade, senso de responsabilidade, reflexão crítica e tantas outras coisas fundamentais podem ser compradas. Porque, afinal, comprar é muito mais fácil que ensinar. É muito mais fácil que orientar. É muito mais fácil que dedicar tempo e atenção a mostrar o que é ou não adequado, coerente, responsável. Por isso, tantas e tantas pessoas compram seus filhos desde a mais tenra infância.

“Se você não for à escola, ou se atrasar, ou reclamar, vai pagar R$ 1,00”. O preço por não estar moldado a um sistema: R$ 1,00.

“Se você não jantar ou não almoçar, vai pagar R$ 0,75”. O preço pelo não entendimento da importância do alimento e de se alimentar bem: R$ 0,75.

“Se você ofender, xingar, brigar ou bater, vai pagar R$ 2,00”. O preço pela agressividade não orientada, pela não compreensão de que bater, xingar ou ofender dói no outro tanto quanto em si próprio: R$ 2,00.

 Além de mostrar a essas crianças que quase tudo na vida pode ser comprado (e que para o resto existe Mastercard), o que estamos fazendo quando agimos assim? Estamos dizendo: “eu não sei te ensinar, mas te comprar eu sei”. Estamos dizendo: “você é uma mercadoria e, como tal, posso te comprar”. Não há, nessa relação, noções de educação e orientação. Há uma relação mercantil onde um detém o poderio econômico e ou outro… é uma mercadoria.

Vamos pensar na relação estabelecida entre um presente e uma criança.

O que um presente produz na criança?

Satisfação. Alegria. Brilho no olhar.

Satisfação, alegria e brilho no olhar podem ser produzidos sem objetos, pela relação que se estabelece entre ela e as pessoas que a rodeiam? Podem. Devem.

Por que, então, transformá-los em capital?

Por que então comprar aquilo que pode ser produzido sem necessidade de colocar, sobre ele, o peso do capital?

Por que achar que datas específicas, criadas exclusivamente para fins capitalistas, pensadas para explorar pessoas, são momentos perfeitos para presentear nossos filhos?

Quem estimulou esse pensamento em você?

Que tipo de valores você está comprando e estimulando que outros comprem?

Por que sentir orgulho e satisfação por sua condição de explorado? E, pior, porque permitir que seus filhos também o sejam?

O Dia das Crianças não foi um dia criado para lembrar que toda e qualquer criança merece ser respeitada, cuidada, protegida – e não ser alvo da exploração capitalista. Não foi um dia criado para lembrar que toda criança tem direitos reconhecidos por uma Declaração Universal. Esse não seria o dia 12 de outubro, mas 20 de novembro, dia em que a Unicef oficializou a Declaração dos Direitos da Criança, em 1959.

O Dia da Criança é apenas uma data comercial, ganhou força no Brasil em 1955 como parte de uma campanha de marketing da Estrela, aquela empresa de brinquedos, que criou a “Semana do Bebê Robusto” (que nome…) com o único objetivo de impulsionar as vendas. E vendeu tanto que o país incorporou a data em seu calendário comemorativo.

Então você, que faz questão de incentivar o consumo nessa data e que se vê como dotado de opinião “própria”, está, na verdade, apenas reproduzindo aquilo que querem que você reproduza: que crianças podem ser exploradas comercialmente por um sistema que não pensa em você nem neles, e que não há mal nenhum nisso.

Muitas mães e pais estão combatendo os apelos desenfreados, antiéticos e cruéis do consumo que vê na infância um alvo perfeito. E enquanto isso, suas crianças estão crescendo. É provável que se tornem adultos antes que o apelo ao consumismo infantil seja vencido.

Se assim for, o que terá sido importante a essas crianças?

Algo que deveria ser muito simples de supor: os valores transmitidos ao longo de toda sua infância. Crianças que cresceram imersas em um outro modelo, um modelo que não valorizou o COMPRAR, mas o SER.  Que não envolve apenas combater o apelo ao consumismo e à publicidade infantil. Que envolve uma compreensão absolutamente diferente do que é a vida, que perpassa a crítica ao consumo exagerado mas, também, a qualidade da alimentação, o tipo de educação, as relações humanas, as relações familiares, o cuidado com o outro, entre todos os demais fatores que, em conjunto, podem ser chamados de vida.

Isso nos leva à frase daquele pacificador tão conhecido: “A felicidade está no caminho”. E ela não pode ser comprada de nenhuma forma. Mesmo que você esteja fazendo muita força para achar que sim.

Quando fazemos as crianças acreditarem que “um dia dedicado a elas” está fundamentalmente atrelado a um “poder de compra” e ao consumo, estamos estimulando a associação entre “ser alguém e ter algo”, o que se traduz em um vazio emocional e na perda da importância das pessoas por seus valores intrínsecos. Pessoas se tornam importantes porque algo é comprado para elas, e não pelo simples fato de que são pessoas. E isso, feito de maneira repetida ao longo de toda sua vida, faz com que a construção de sua identidade esteja associada a compra e a produtos. E é exatamente isso que a sociedade capitalista deseja.

É compreensível que muitas pessoas tenham resistência a problematizar a questão e que não enxerguem o problema do apelo ao consumo que o dia das crianças traz, principalmente quando consideramos a sua própria infância. É muito provável que essa pessoa também tenha crescido em um ambiente sem essa problematização. Mas isso não é um círculo impossível de ser quebrado, todos nós podemos interrompê-lo a qualquer momento e não permitir que nossos filhos sejam mais um elo dessa cadeia.

“A criança aprende que consumir é bom e prazeroso, principalmente quando há exemplo dos pais, a quem imita.

(…) A inserção da criança de dois a sete anos no mundo do consumismo é diretamente proporcional à qualidade e às configurações dos relacionamentos estabelecidos entre os pais e os filhos, de forma que há atitudes dos pais que podem estimular o consumo infantil e atitudes que podem desencorajá-lo. Nesse cenário, é absolutamente relevante considerar o sentimento da infância dos pais, ou seja,

quais percepções e concepções de criança eles têm, como tratam a infância e como estabelecem as relações com os filhos. O ambiente familiar como lugar de transmissão é geralmente o primeiro grupo social no qual a criança se insere, e, nesse sentido, as percepções dos pais sobre o que é ser criança são indissociáveis dos relacionamentos estabelecidos com os filhos.

 (Tiago Bastos de Moura, Flávio Torrecilas Viana e Viviane Dias Loyola, em “Uma análise de concepções sobre a criança e a inserção da infância no consumismo”)

 Que até o próximo 12 de outubro, no intervalo de um ano, nós possamos refletir sobre o que de fato é importante estimular em pessoas que criam outras pessoas e sobre qual nosso papel, de fato, na formação de uma sociedade que realmente respeite a infância. Que possamos mudar hábitos e reivindicar o respeito à infância, como forma de melhorar as relações humanas.

Crianças não precisam de bonecas que fazem xixi e cocô. Crianças precisam de gente que as defendam sempre, o ano inteiro.

Ainda que, ao fazer isso, sejam chamadas de patrulheiras, chatas e radicais. Afinal de contas, foram sempre os patrulheiros chatos e radicais os que conseguiram mudar o que precisava ser mudado. Não os que não veem problema em comprar e vender a infância.

Deixo aqui, nesse pós dia das crianças, meu agradecimento a duas turmas que estão constantemente na luta por seus e nossos filhos: os coletivos Infância Livre de Consumismo e Bater em Criança é Covardia.

Obrigada por tudo, amigos e amigas.

Um grande abraço

...

(*) Ligia é mãe da Clara, mora em Florianópolis, estuda a violência no parto e escreve o blog Cientista Que Virou Mãe.


13 out 2013

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Crianças não poderão participar de propaganda na televisão



Crianças não poderão participar de propaganda na televisão

Enviado por luisnassif
sab, 02/02/2013
Da Folha

Conar proíbe participação de crianças em merchandising
De São Paulo

O Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) determinou novas regras em relação à publicidade dirigida ao público infantil -- até 12 anos.

A partir do dia 1º de março, crianças não poderão mais participar de ações de merchandising na televisão.

A realização de merchandising de produtos e serviços voltados para esse público também não será mais aceita, seja em programas voltados para o público infantil, adolescente ou adulto.

De acordo com a entidade, a publicidade de produtos e serviços focada no público infantil deve se restringir aos intervalos e espaços comerciais.

"O Conar, mais uma vez, corresponde às legítimas preocupações da sociedade com a formação de suas crianças", diz, em nota, Gilberto Leifert, presidente do conselho.

Leifert diz, contudo, que não se deve impedir a exposição de crianças à publicidade ética. "O consumo é indispensável à vida das pessoas e entendemos a publicidade como parte essencial da educação. Privar crianças e adolescentes do acesso à publicidade é debilita-las, pois cidadãos responsáveis e consumidores conscientes dependem de informação".

A autorregulamentação já previa veto a ações de merchandising de alimentos, refrigerantes e sucos em programas especificamente dirigidos a crianças.

De acordo com a entidade, ainda que seja de adesão voluntária, o documento é unanimemente aceito e praticado no país por anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação.

Para ler o código na íntegra, acesse o site do Conar.

Leia a íntegra das novas regras da Seção 11 do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, que passam a valer em março:

*
SEÇÃO 11 - CRIANÇAS & JOVENS
Artigo 37

3 - Este Código condena a ação de merchandising ou publicidade indireta contratada que empregue crianças, elementos do universo infantil ou outros artifícios com a deliberada finalidade de captar a atenção desse público específico, qualquer que seja o veículo utilizado.

4 - Nos conteúdos segmentados, criados, produzidos ou programados especificamente para o público infantil, qualquer que seja o veículo utilizado, a publicidade de produtos e serviços destinados exclusivamente a esse público estará restrita aos intervalos e espaços comerciais.

5 - Para a avaliação da conformidade das ações de merchandising ou publicidade indireta contratada ao disposto nesta Seção, levar-se-á em consideração que:

a. o público-alvo a que elas são dirigidas seja adulto
b. o produto ou serviço não seja anunciado objetivando seu consumo por crianças
c. a linguagem, imagens, sons e outros artifícios nelas presentes sejam destituídos da finalidade de despertar a curiosidade ou a atenção das crianças.

Reproduzido de Advivo
Por Luís Nassif
02 fev 2013

sábado, 10 de novembro de 2012

Consumismo infantil na contramão da sustentabilidade



Consumismo infantil na contramão da sustentabilidade

Instituto Alana e Ministério do Meio Ambiente lançam cartilha sobre relação entre consumismo infantil e sustentabilidade com dicas e sugestões para pais e educadores.

Um evento em Brasília marcou o lançamento do caderno “Consumismo infantil: na contramão da sustentabilidade”, uma parceria do Instituto Alana com o Ministério do Meio Ambiente (MMA). O objetivo da publicação é ajudar os pais e educadores a trabalharem com as crianças a diferença entre o “querer” e o “precisar”, além de abordar temas como sustentabilidade, descarte e consumo.

Medidas como o consumo de lanches feitos em casa, mais saudáveis e que geram menos lixo e descarte de embalagens, são incentivadas. O material também traz alguns dados preocupantes sobre a influência da publicidade no consumismo infantil. Dados do Ibope mostram que, hoje, as crianças passam mais de cinco horas por dia na frente da televisão. E que 64% de todos os anúncios veiculados nas emissoras de TV, monitoradas às vésperas do Dia das Crianças de 2011, foram direcionados ao público infantil (Alana/UFES).

O livreto é o terceiro volume da série Cadernos de Consumo Sustentável, publicada pelo Ministério do Meio Ambiente. Durante 2013, o Ministério da Educação deverá distribuir 70 mil exemplares da obra; o Ministério do Meio Ambiente, 10 mil e a Federação Nacional das Escolas Particulares (FENEP), mais 15 mil em todo o território brasileiro.

Que tal aproveitar as dicas da cartilha e começar a ensinar a seus filhos alternativas ao consumo sem reflexão? O documento está disponível para download.

O evento de lançamento do caderno em Brasília contou com as presenças de Gabriela Vuolo, Coordenadora de Mobilização do Alana; Samyra Crespo, Secretária de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental do Ministério do Meio Ambiente; Angélica Goulart, Secretária Nacional da Criança e Adolescente da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; e Juliana Pereira, Secretária Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça.

Reproduzido de Instituto Alana
Nov 2012

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Infância livre do Consumismo: Pelo fim nas tvs fechadas, restrição nos canais abertos e regulamentação em todo país da propaganda infantil!



Infância livre do Consumismo: Pelo fim nas tvs fechadas, restrição nos canais abertos e regulamentação em todo país da propaganda infantil!

Somos mães, pais, tios, tias, padrinhos, madrinhas, amigos, amigas de crianças e queremos o fim das propagandas que incentivam o consumo nas emissoras que veiculam programação infantil. Você que é contra esse abuso confirma presença no evento e amanhã dia 12/10/2012 e nos dias sequentes mande mensagem para as páginas das emissoras que mais veiculam propaganda sugestionando o consumismo em nossas crianças.

Somos a favor também que seja votada uma lei que regulamente a propaganda infantil em todo o país.

Emissoras que mais veiculam conteúdo constante de propaganda durante a programação infantil:


Por que propaganda é prejudicial às crianças?

A publicidade dirigida ao público infantil é danosa porque pressiona as crianças a desejarem cada vez mais bens de consumo, associando-os a um discurso enganoso de alegria, felicidade e status social. Esses bens de consumo podem ser alimentícios, de vestuário, brinquedos ou até mesmo itens para adultos anunciados para as crianças, que tornam-se promotores de tais produtos, indicando-os aos pais. Além de trazer sofrimento às crianças que não podem adquirir esses bens devido à falta de recursos financeiros, essa pressão causa estresse familiar e não pode ser devidamente elaborada pelos pequenos, cujo senso crítico ainda está em desenvolvimento.

Publicidade dirigida a crianças é incompatível com o ideal de uma sociedade que preza o bem-estar de seus cidadãos. E não é à toa que em países como a Suécia ela é proibida. O marqueteiro, que estudou vários anos e em geral fez curso superior, é um especialista em psicologia infantil, estuda os hábitos, conhecendo profundamente os desejos e aspirações de seu público-alvo. Todo esse conhecimento tem como propósito derrubar as barreiras, filtros e principalmente a consciência crítica que define critérios para a compra de produtos. O que importa ao marqueteiro é obter o resultado esperado pelo anunciante: vender mais para mais gente. Para eles, o mercado infantil também representa a busca pela fidelização da marca pelas crianças desde a infância. Do outro lado, está a criança, geralmente solitária, indefesa e vulnerável, pois ainda não aprendeu as manhas do mundo adulto e acredita no que lhe é dito e mostrado. A disputa é covarde.

No Brasil, a televisão ainda tem um papel muito importante no cotidiano das famílias: além de servir como “babá eletrônica” para crianças de todas as classes sociais, nos lares menos favorecidos, ainda numerosos no país, há somente um cômodo ou dois, não deixando a possibilidade de “tirar os filhos da sala”, ainda que os pais estejam por perto. Assim, não podemos responsabilizar somente pais e mães que trabalham dentro ou fora de casa pelo conteúdo a que seus filhos assistem diariamente nem pelo efeito disso em seus comportamentos.

Além disso, estamos diante de um novo fato: pela primeira vez na história humana, se questiona a forma como estamos consumindo o planeta Terra. As crianças de hoje serão responsáveis pelo planeta de amanhã. Mas, ao invés de serem educadas para se tornarem cidadãs conscientes, elas estão sendo transformadas em consumidoras desde a mais tenra idade.

O excesso de propagandas e o conteúdo manipulatório delas incentiva o consumismo e dificulta a educação cidadã e sustentável que todos desejamos.

Como funciona no Brasil atualmente?

No Brasil, o próprio mercado publicitário regulamenta toda a publicidade mercadológica por meio do Conar, que estabelece as normas e julga os casos encaminhados por entidades representativas ou cidadãos comuns. Abusos também podem ser encaminhados ao Procon e ao Ministério Público, a depender da natureza do problema.

Como é no resto do mundo?

Existem diversas políticas diferentes no mundo quando o assunto é publicidade e infância. Vamos falar aqui sobre a abordagem de outros países. Acompanhe e participe dos debates.

Por que não estamos satisfeitos com a autorregulamentação em vigor atualmente no Brasil?

Quando alguém denuncia uma publicidade abusiva, o Conar avalia se a queixa é pertinente para só então sugerir mudanças ou tirá-la do ar. Quando a denúncia vai para análise, o que não é frequente, o processo pode levar algum tempo: geralmente meses se passam até que uma decisão seja tomada. Até lá, o comercial continua sendo transmitido. O Conar até hoje deu parecer sobre 7.500 anúncios. Em um universo de centenas de milhares de comerciais, muita coisa acaba passando despercebida e atinge nossos filhos. Além disso, os anunciantes patrocinam programas de baixo nível ou canais infantis com intervalos comerciais acima do permitido.

Como queremos que seja no Brasil?

Para garantirmos a proteção das crianças brasileiras contra o consumismo e a publicidade predatória:

a) queremos mais espaços de diálogo direto entre os pais/familiares e os governos e as agências reguladoras da publicidade infantil no que diz respeito à elaboração dos marcos regulatórios;

b) queremos regras mais claras que evitem a entrada da publicidade em espaços que são das crianças por excelência, como escolas e consultórios de pediatria;

c) queremos que os governos brasileiros participem ativamente dos debates internacionais acerca do tema e tragam para nossa experiência o que for relevante; e

d) queremos o fomento a mais pesquisas na área da educação e mídias que incluam também os pais como atores fundamentais nessa relação.

O que é autorregulamentação?

Autorregulamentação é um mecanismo de autodisciplina por meio do qual um setor da sociedade, através de seus representantes, concorda em estabelecer um conjunto de regras a fim de garantir qualidade, segurança e responsabilidade no que diz respeito a seus serviços e produtos. No caso da publicidade, os publicitários e os veículos de comunicação, representados por suas associações, atualmente ditam as regras às quais o setor deve se submeter, sendo também responsáveis pela fiscalização do seu cumprimento. Eles se autorregulam e, claro, diante dos interesses financeiros envolvidos, a eficácia dessa regulamentação deixa muito a desejar em termos de fiscalização, cumprimento e penalização das possíveis infrações.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

“Mãe, eu quero. Você compra?”


Publicidade para Crianças

“Mãe, eu quero. Você compra?”

Por Rosely Arantes em 24/07/2012 na edição 704

A frase do título, que muitas vezes culmina em uma discussão, tem feito parte do dia a dia da maioria das famílias brasileiras nos últimos tempos. Discutir os limites das crianças frente ao que é apresentado nas televisões, via publicidade, é algo que muitas vezes está além do alcance das mães, pais e até educadores. Não raro vemos matérias, baseadas em pesquisas ou estudos psicológicos, que desvendam os caminhos para a atuação, para não dizer manipulação e controle, sobre o público infantil numa tentativa de reforçar o apelo de compra.

Contrariando um caminho trilhado, há anos, por diversos países com democracias consolidadas, como a Suécia, Alemanha, Austrália, Espanha (Catalunha), Chile, Estados Unidos, Holanda, Nova Zelândia, Portugal e Reino Unido, o Brasil continua permitindo que a publicidade seja direcionada ao público infantil. Mesmo que a criança e o adolescente sejam considerados públicos prioritários pela Constituição brasileira e reforçado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), eles continuam sendo alvo das propagandas e do merchandising, instrumentos da publicidade,que os utilizam como mecanismo de “fidelização” de um futuro consumidor e, ultimamente, definidor de compras da família, numa estratégia de infantilizar o adulto e dar uma ideia de maturidade às crianças, numa troca de responsabilidades vil.

O que é mais estranho é que todas essas ações, que são consideradas violações de direitos, dão-se no espaço público do audiovisual, ou seja, nas rádios e televisões, que são concessões públicas. Para ser mais clara, é de propriedade do Estado o espectro eletromagnético que é temporariamente cedido a determinadas empresas de comunicação. E como parte das regras desta concessão está a atenção ao que já é estabelecida em lei, como informado no parágrafo acima. Como afirma o mestre em Ciência Política, pela Universidade de São Paulo, professor Guilherme Canela, “se o Estado (governo e sociedade) acorda institucionalmente que esse recorte etário merece prioridade absoluta, à mídia não é conferido nenhum salvo-conduto para se escusar de cumprir suas responsabilidades, especialmente porque radiodifusores são operadores de concessões públicas do Estado e da sociedade”.

Programação para todos os públicos

Esse “descumprimento” do acordo entre o Estado e o mercado ultrapassa também outras esferas, como a regulamentação do setor, defendida por organizações da sociedade civil e pesquisadores da área. No Brasil, o próprio mercado publicitário regulamenta toda a publicidade mercadológica por meio do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que estabelece as normas e julga os casos que porventura sejam enviados por entidades representativas ou cidadãos comuns. Para o presidente da entidade, Gilberto Leifert, as tentativas de regulamentação revelam que o Estado não acredita no poder de discernimento do cidadão. “É um evidente paradoxo. Muitas vezes, o projeto de lei ou a intervenção do Estado sugere que o cidadão é considerado plenamente capaz apenas para constituir família, eleger representantes políticos, pagar impostos, mas seria incapaz de fazer escolhas a partir da publicidade”, afirma.

Outra prova da complexidade do que estamos falando se deu com a retirada do programa infantil diário TV Globinho, substituído por um voltado para o público adulto capitaneado pela jornalista Fátima Bernardes nas manhãs na TV Globo. A emissora, que já chegou a apresentar O Sítio do Pica-Pau Amarelo, Vila Sésamoe Xou da Xuxa, apresentou como argumentação que a grade infantil não dá nem audiência, nem receita publicitária, e diz seguir tendência internacional de deixar as crianças para a TV paga. Segundo a empresa, o canal fechado seria um espaço menos sujeito a controle externo, como classificação indicativa, sugerida pelo governo e proibições à publicidade infantil (como limite à propaganda de alimentos e ao uso de desenhos para seduzir o público-alvo). “O segmento infantil está na TV paga porque lá não tem censura nem restrição à propaganda”, diz Luís Erlanger, diretor da Central Globo de Comunicação. Importante questionar, neste caso, como ficam as crianças que não têm TV paga, já que o lazer e entretenimento também são direitos e a TV é uma concessão pública? Isso sem falar que como concessionária de um serviço público a empresa deve cumprir com o regulamento que prevê programação para todos os públicos.

Direito de ter brinquedo

Mas muitas pesquisas e estudos também são realizados para medir o impacto da publicidade no desenvolvimento psíquico e emocional, atual e futuro, das crianças e adolescentes. E os resultados são alarmantes. Segundo o Instituto Alana, organização não governamental de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes em relação ao consumo em geral, bem como ao excessivo consumismo ao qual são expostas, as crianças são mais vulneráveis que os adultos e sofrem cada vez mais cedo com as graves consequências relacionadas aos excessos do consumismo, por estarem em pleno desenvolvimento. Para o Alana, são consequências danosas à exposição excessiva a obesidade infantil, a erotização precoce, o consumo precoce de tabaco e álcool, o estresse familiar, a banalização da agressividade e violência, entre outras.

Mas como não se mudam leis e costumes num passe de mágica, algumas tentativas de minar o poderio do mercado e proteger as crianças têm sido realizadas. Cabe registrar que está em tramitação no Congresso Nacional, há mais de dez anos, um projeto de lei que proíbe a publicidade de produtos infantis (PL 5921/01). O texto, de autoria do deputado Salvador Zimbaldi (PDT-SP), que faz parte da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, já foi alterado nas comissões de Defesa do Consumidor e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio. Para o relator, “é necessária uma lei sobre publicidade infantil porque o Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar) não tem sido eficaz”. Depois que Zimbaldi apresentar o parecer, a proposta seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça em caráter conclusivo.

O anteprojeto encontra bastante resistência por parte do setor empresarial, especialmente o de brinquedos. Para o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), que também é presidente da Fundação Abrinq, Synésio Batista, a publicidade infantil é fundamental já que toda criança tem o direito de ter brinquedo e a publicidade ajuda a aumentar a produção, despertando o interesse e deixando a criança informada, “não se oferece um produto dizendo o que ele não tem”, afirma Batista.

Discurso mágico

Outra forma de quebrar o bloqueio empresarial está na capacidade de organização da sociedade. Já é possível perceber que há intervenção de diversos setores desta na defesa pela regulamentação e isso tem mexido na estrutura de poder e aberto diversas frentes de debates sobre o tema criança e consumismo, especialmente nas redes sociais. Por conta disso, algumas campanhas publicitárias foram tiradas do ar. A mais recente foi o parque Mundo da Xuxa, que foi notificada pelo Procon/SP, e não pelo Conar, que apresentou como justificativa “o potencial de induzir o público infantil a atitudes que gerem risco à segurança e a saúde”. Importante registrar que esta campanha só saiu do ar depois que o coletivo Infância Livre de Consumismo (ILC), junto com outros movimentos e organizações, registrou queixas contra a propaganda. Este é outro exemplo de organização. Já as empresas Nestlé, Mattel, Habib’s, Dunga Produtos Alimentícios Ltda. (Biscoito Spuleta) e Roma Jensen (Roma Brinquedos) receberam as multas, também do Procon/SP, na semana passada, num total de mais de R$ 3 milhões, por campanhas publicitárias abusivas dirigidas ao público infantil. Estas últimas também foram resultado de mobilização de organizações da sociedade civil.

O Infância Livre de Consumismo (ILC) é um coletivo de pais, mães e cidadãos inconformados com a publicidade dirigida às crianças que nasceu como contraponto a campanha “Somos todos responsáveis”, promovido pela Associação Brasileira das Agências de Publicidade (ABAP). “Por mais informadas e conscientes que sejam as famílias, os pais não têm como combater um discurso mágico e atraente feito por adultos pertencentes a grandes e poderosos conglomerados empresariais, com alto poder econômico, que detêm pesquisas psicossociais, de mercado e até mesmo neurológicas”, avalia Marina Machado de Sá, publicitária e mestre em Políticas Públicas, uma das fundadoras do coletivo Infância Livre de Consumismo (ILC).

“Atentado à liberdade de expressão comercial”

Já a campanha “Somos todos responsáveis” defende que apenas os pais seriam os responsáveis pela proteção das crianças diante dos estímulos abusivos das propagandas ao consumismo. Para eles é importante, necessária e sadia submeter às crianças à informação. “Se a ideia é proteger as crianças da mídia, não adianta mais desligar a televisão, abaixar o volume do rádio e ficar longe das bancas de jornais”, diz Dalton Pastore, presidente do Conselho Superior da Abap. “A questão é mais complexa e merece uma discussão mais profunda, baseada em educação, e não em proibição”, complementa.

No entanto, atitudes como esta isentam o Estado e o mercado (empresas e publicitários) de quaisquer responsabilidades sobre a publicidade dirigida às crianças. “Nesta relação, fica patente a vulnerabilidade das famílias, da comunidade e da própria criança diante do discurso mercadológico”, alerta Mariana Sá.

Um alerta interessante feito por essas organizações diz respeito aos problemas causados ao meio ambiente. Segundo o ILC, o excesso de propagandas e conteúdo manipulatório dirigidos ao público infantil dificulta a educação cidadã e sustentável e vai contra a formação de um consumidor consciente, justo num momento em que o mundo repensa formas de consumo sustentáveis.

Assim cabe uma reflexão sobre o que está por trás dessa resistência do mercado no diálogo sobre a regulamentação do setor. É importante e urgente entender que isso é uma das pontas do iceberg chamado democratização da comunicação. Tema este que merece ser aprofundado, especialmente para entender o porquê de o discurso mercadológico estar baseado na censura e na defesa da liberdade de expressão. Como bem afirma Gilberto Leifert, a proibição de propaganda infantil é um “atentado à liberdade de expressão comercial”. Num país que acabou de sair de um processo de ditadura onde o calar foi um dos recursos mais (bem) utilizados, qualquer aceno que relembre esse momento é evidentemente danoso, significativo e causa aversão. Segundo o coordenador executivo da organização Andi Comunicação e Direitos, Veet Vivart, “associar a regulação, que é um instrumento democrático, interdita o debate”.

Cúmplices de violações

Daí surge outro debate sobre o porquê da importância dos pais, mães e demais responsáveis pelo cuidado direto de crianças e adolescentes, dizerem “não” aos constantes pedidos de “compra” emitidos por eles. Dizer não além de ser educativo, ajuda a criançada a entender que a vida não é o “céu de brigadeiro” que a TV mostra. Dito isso, é salutar compreender que um dos recursos da publicidade é o de se aproveitar do (grande) tempo que as crianças ficam exposta a programas televisivos, longe da presença de adultos, para impor uma lógica de consumo desenfreado, por meio de técnicas de aborrecimento (onde vencem pelo cansaço), aumento do volume no momento dos comerciais, o uso constante de merchandising, entre outras. Para se ter uma ideia do que estamos falando, as crianças brasileiras ficam até cinco horas na frente da TV, diferentemente de outros países, inclusive os Estados Unidos. No final, temos crianças obesas, sedentárias, doentes e mal informadas, para não aprofundar mais neste debate.

No final, a maioria dos pais e mães que trabalham fora de casa e, portanto, ficam longe de seus filhos, vê-se obrigado a comprar, atendendo aos pedidos insistentes do filho, na tentativa de suprir o tempo perdido. Mas é preciso entender que não se compra tempo, atenção e afeto, especialmente das crianças. Faz-se necessário e urgente refletir e criar estratégias de recompensa desse tempo a partir de momentos de aproximação, conversa, troca e atenção, onde os pais e mães fiquem com suas crianças e promovam momentos de interação com eles. Isso vale muito mais do que um brinquedo, na maioria das vezes caro, que será deixado de lado, em breve. Sem contar que é fundamental avaliar o pedido de compra. Afinal, é algo que vai ser realmente utilizado pela criança, é adequado para a idade, vai ajudá-lo de alguma forma, que habilidades serão desenvolvidas? Porquedo contrário, a velha resposta do “porque agora não tenho dinheiro”, atrapalha por não acrescentar, por não ajudar a pensar de forma sustentável e educativa. O “não” tem de estar embasado em outras motivações.

Importante resgatar que o processo de debate e regulação proposto pela sociedade civil é algo que deve inclusive acontecer dentro da esfera pública do Estado. Afinal,cabe a este ente promover e induzir os processos de garantia de direitos, uma vez que ele é o representante formal, referendado noutro processo democrático de consulta pública.

Por fim, quero lembrar que este é mais um ano de eleições e que estaremos escolhendo a/os nossa/os futura/os representantes à Prefeitura e Câmara de Vereadores. Em dois anos, escolheremos a/o presidente, governadores, senadores e deputados. E quantas vezes procuramos saber qual o plano de governo que eles propõem, nossas demandas de focar as crianças estão contempladas ou mesmo se acompanhamos esses compromissos pleiteados durante a campanha? Acredito que não. Normalmente preferimos nos omitir sob a desculpa de que política é lugar de corrupção, privilégios e impunidade. No entanto, essa postura nos coloca como cúmplice das inúmeras violações direcionadas a população infanto-juvenil brasileira.

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[Rosely Arantes é jornalista, educadora popular e especialista em Gestão Estratégica Pública]

24 jul 2012

domingo, 24 de junho de 2012

Para Marina Silva, criança precisa ser protegida de bombardeio do ter


Para Marina Silva, criança precisa ser protegida de bombardeio do ter

Uma das pessoas mais respeitadas no Brasil nas discussões sobre sustentabilidade, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva falou à equipe do Alana sobre a importância de proteger a infância do verdadeiro bombardeio de apelos para o consumo. Segundo ela, governo, sociedade, meios de comunicação e empresas têm o dever compartilhado de garantir essa proteção.

"As pessoas estão intoxicadas pelo consumo", comentou Marina sobre o materialismo, que ameaça o futuro das crianças. Ela ainda chamou a atenção para a necessidade urgente de investir na educação para o consumo.

Reproduzido de Consumismo e Infância



Foto: Kosta Boda "Earth: Home" Decorative Globe

In the Earth series, Bertil Vallien has created four different globes, each with its own characteristic houses and message. Their names—My Garden, Home, Winter Garden and Lonely House—tell a bit about the history of each globe and Vallien’s ideas behind the series. Each globe is hand-made with great care. Bloomingdales

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Os riscos da publicidade infantil sem regulamentação


Os riscos da publicidade infantil sem regulamentação

Bonecas que cantam e dançam sozinhas e vivem em um mundo colorido, cheio de efeitos especiais; jogos que são capazes de reunir amiguinhos e pais para uma partida cheia de sorrisos e diversão; tênis ou sandálias da moda que garantem a quem os usa sucesso instantâneo, atraindo olhares e interesse por onde passam. Para os adultos é fácil perceber que esses exemplos de peças publicitárias servem para convencer o público a comprar os produtos apresentados. Para as crianças, no entanto, o cenário e os resultados produzidos são facilmente confundidos com a realidade, garante a especialista em comunicação Luciene Ricciotti.

Segundo ela, que também é membro da Rede de Trabalho do Instituto Alana, organização sem fins lucrativos voltada para a defesa de crianças e adolescentes, o público infantil não conta com desenvolvimento psicológico suficiente para fazer essa diferenciação e identificar os apelos do marketing.

“Quando a criança vê a propaganda, ela vê o cenário, o conjunto e diz que quer. Mas muitas vezes ela não quer o brinquedo, ela quer a mãe brincando com ela no tapete como aparece na televisão. Aí a gente compra, e o brinquedo acaba no fundo do armário”, disse a especialista, que é autora do livro A Criança e o Marketing, escrito em parceria com a psicóloga Ana Maria Dias da Silva.

A especialista defende que pais e professores discutam os objetivos da propaganda com filhos e alunos e os orientem a perceber que nem sempre precisamos dos objetos e serviços que nos são apresentados. O esforço, acredita, ajuda essas crianças a serem, no futuro, consumidores conscientes. Luciene Ricciotti acrescenta que a tarefa dos pais é ainda mais difícil porque a criança, em geral, não percebe o fim do desenho e o início da propaganda. “Para ela, os dois têm a mesma credibilidade”, explica.

“A ideia é orientar as crianças, contar o que é o marketing e dizer que a função dele é atender necessidades de consumidores. É importante preparar a criança para o mundo em que a gente vive. Mais cedo ou mais tarde ela vai ter acesso às marcas, ao assédio das empresas e precisamos orientá-las a não consumirem tanto por impulso. Comprar não é errado, o errado é comprar, comprar, comprar e guardar, guardar, guardar, o que caracteriza o consumismo”, alertou.

Para Ana Cláudia Bessa, uma das fundadoras do movimento Infância Livre de Consumismo, coletivo formado por pais e mães inconformados com os estímulos da publicidade infantil ao consumo excessivo, a família não pode ser totalmente responsabilizada pela formação do consumo consciente em crianças e adolescentes. Segundo ela, trata-se de uma disputa “cruel e desigual”. A ativista defende a proibição de propagandas voltadas para esse público.

“Não temos como competir com as mensagens criadas por adultos, que estudaram para isso, voltadas às crianças, que não têm condição de discernir o que é verdade, manipulação ou mentira. Além disso, crianças não podem decidir o que vão consumir, afinal elas não geram renda”, ressaltou, acrescentando que essa realidade é responsável por conflitos familiares e constantes frustrações, já que “é impossível para a maioria das pessoas comprar sempre todos os lançamentos apresentados nas propagandas”.

“Essa necessidade produzida, além de tudo, compromete a sustentabilidade do planeta porque, baseados no consumismo, em pouco tempo, estaremos lotados de lixo, com o ambiente totalmente degradado e sem água para beber”, completou.

Reportagem de Thais Leitão, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 05/06/2012

[O conteúdo do EcoDebate é “Copyleft”, podendo ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, ao Ecodebate e, se for o caso, à fonte primária da informação]

Foto: Fiocruz

Reproduzido de Eco Debate
05 jun 2012

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Alimentos envenenam crianças


Alimentos envenenam crianças

Frei Betto*
Escritor e assessor de movimentos sociais
Adital

"As crianças de todas as regiões das Américas estão sujeitas à publicidade invasiva e implacável de alimentos de baixo ou nenhum valor nutricional, ricos em gordura, açúcar ou sal”, constata pesquisa da Organização Pan-Americana da Saúde (2012).

Basta olhar em volta para verificar que nossas crianças (com menos de 16 anos de idade) apresentam elevada taxa de obesidade e doenças crônicas relacionadas à nutrição, como diabetes e distúrbios cardiovasculares.

Um dos fatores que mais influenciam maus hábitos alimentares nesta faixa etária é a publicidade de produtos de baixo valor nutritivo, como cereais matinais já adoçados, refrigerantes, doces, sorvetes, salgadinhos e fast food. Eles "enchem” a barriga, trazem sensação de saciedade sem, no entanto, suprir as necessidades nutricionais básicas.

Resolução da Organização Mundial da Saúde, de maio de 2010, instou os governos a se esforçarem por restringir a promoção e a publicidade de alimentos para crianças.

O mais poderoso veículo de promoção de alimentos nocivos é a TV. Expostas excessivamente a ela, as crianças tendem a querer consumir as marcas ali anunciadas. Em geral, a propaganda cria vínculos emocionais entre o produto e o consumidor, e envolve brindes, concursos e competições.

Sob o pretexto de atividades filantrópicas nas escolas, empresas de alimentos não saudáveis aumentam seu poder de domesticação. Pesquisas brasileiras indicam que assistir TV por mais de duas horas por dia influi no aumento do índice de massa corporal em meninos.

Relatório de agência de pesquisa de mercado aponta que, no Brasil, na Argentina e no México, 75% das mães com filhos de 3 a 9 anos acreditam que a publicidade influencia os pedidos das crianças na compra de alimentos (no Brasil, 83%).

No Reino Unido, é proibida na TV a publicidade de alimentos não saudáveis. A Irlanda limita a presença de celebridades nesses anúncios e exige o uso de advertências. A Espanha desenvolveu um código autorregulatório e restringe o uso de celebridades e a distribuição de produtos no mercado.

Segundo relatório do Ministério da Saúde (2008), durante um ano, no Brasil, mais de 4 mil comerciais de alimentos foram veiculados na TV e em revistas, dos quais 72% referiam-se a alimentos não saudáveis.

No Brasil, regulamentação vigente obriga colocar advertências nos comerciais de alimentos, embora a ABIA, principal associação da indústria de alimentação do país, se recuse a fazê-lo. Ela obteve liminar garantindo a não aplicação das novas regras e a decisão final depende agora da Justiça.

É preciso, pois, que famílias e escolas se dediquem à educação nutricional das crianças. Peças publicitárias devem ser projetadas em salas de aula e debatidas. Cria-se, assim, distanciamento crítico frente ao produto e melhor discernimento por parte dos consumidores.

Em São Paulo, alunos projetaram em sala de aula propagandas gravadas em casa. Após debaterem as peças publicitárias, decidiram adquirir determinada marca de iogurte. Remetido o conteúdo à análise clínica, constatou-se não conferir com as indicações contidas na embalagem. Assim, os alunos aprenderam o que significa propaganda enganosa.

A Organização Pan-Americana da Saúde recomenda que sejam anunciados, sem restrição, os alimentos naturais, aqueles nos quais não há adição de adoçantes, açúcar, sal ou gordura. São eles: frutas, legumes, grãos integrais, laticínios sem gordura ou com baixo teor, peixes, carnes, ovos, frutas secas, sementes e favas. No caso de bebidas, água potável.

Eis o dilema: enquanto famílias e escolas querem formar cidadãos, a publicidade investe na ampliação do consumismo. A ponto de, no Brasil, se admitir o uso de celebridades, como atletas, na propaganda de alimentos não saudáveis e obviamente nocivos, como bebidas alcoólicas.

É preocupante constatar que, em nosso país, o alcoolismo se inicia por volta dos 12 anos, e aumenta a ingestão de vodca na faixa etária inferior a 16 anos.

A fiscalização em bares e restaurantes é precária, e padarias e supermercados vendem, quase sem restrição, bebidas alcoólicas a menores de idade.

Mas, o que esperar de uma família ou escola que oferece na mesa e na cantina os mesmos produtos nocivos vendidos pelo camelô da esquina?

Essa é a crônica de graves enfermidades anunciadas.

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* Frei Betto é escritor, autor de "Alfabetto – autobiografia escolar” (Ática), entre outros livros.

Twitter:@freibetto

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Reproduzido com autorização do autor via e-mail (07/07/12) tal como feito em Adital (28/05/12) via Altamiro Borges (04/06/12)