Daniel Azulay e a Turma do Lambe-Lambe na TVE do Rio
O fim dos programas infantis na TV
O abandono das crianças pelas emissoras
exige uma resposta institucional. É necessário obrigar os canais a reservarem
espaço ao público infantil.
Laurindo Lalo Leal Filho
Os programas
infantis estão desaparecendo da TV aberta brasileira. Nas redes comerciais
resta apenas o Bom Dia e Cia, exibido pelo SBT. O motivo não está na resolução
(163)* do Conanda
(Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), de abril do ano passado,
proibindo a exibição de comerciais voltados para o público infantil como chegou
a ser apregoado.
O desprezo das
TVs pelas crianças é muito anterior a isso. Bem antes as emissoras já vinham
substituindo aqueles programas por atrações dirigidas para um público mais
amplo, capazes de atrair uma gama maior de anunciantes, especialmente através
do chamado merchandising, prática usual na TV brasileira ainda que proibida
pelo Código de
Defesa do Consumidor, em seu artigo 36.
A Globo acabou
com a TV Globinho colocando no lugar o programa Encontro com Fátima Bernardes.
A Record trocou os desenhos animados pelo Hoje em Dia, uma revista de
variedades. Não que os programas infantis dessas redes tivessem qualidade
excepcional, como tinham as antigas produções da TV Cultura de São Paulo,
sempre lembradas como referências no gênero: Ra-Tim-Bum, Bambalalão, Mundo da
Lua, entre outros. Ou os do Daniel Azulay na antiga TVE do Rio de Janeiro. Mas
eram o mínimo de respeito ainda existente no relacionamento das emissoras com o
público infantil. Até isso acabou.
Além do
merchandising, outro fator contribuiu para encolher a programação dirigida às
crianças na TV aberta comercial: o sucesso dos canais pagos voltados para esse
público. São líderes de audiência, tendo como espectadores crianças de famílias
com poder aquisitivo mais elevado, capazes de pagar pelo serviço. Às demais
restam os canais públicos de sintonia muito mais difícil do que a das grandes
redes comerciais. Ainda assim os programas infantis lideram a audiência nas
programações da TV Cultura de São Paulo e da TV Brasil.
Movidas
exclusivamente por seus interesses mercadológicos, as emissoras privadas,
concessionárias de um serviço público, deixam de cumprir a determinação
constitucional que, em seu artigo
221, as obriga a dar preferência a programas com “finalidades educativas,
artísticas, culturais e informativas”.
Nos Estados
Unidos, para enfrentar a lógica do mercado, a lei determina que as emissoras
transmitam, no mínimo, três horas semanais de “programação infantil essencial”,
identificando os programas com o símbolo E/I, além de informarem
antecipadamente os pais sobre os horários de exibição. Os programas devem
ir ao ar entre às 7h e às 10h da manhã, com pelo menos 30 minutos de duração.
No Brasil, o
abandono das crianças pelas emissoras comerciais exige uma resposta
institucional. É necessário que no ato de outorga das concessões de TV exista
uma cláusula obrigando as emissoras a reservarem espaços generosos e bem
localizados de suas grades de programação ao público infantil.
Essa medida,
combinada com a proibição total da veiculação de anúncios dirigidos às
crianças, elevaria significativamente o patamar civilizatório existente hoje no
país.
Reproduzido de Carta
Maior
03 abr 2015
* Resolução 163 do Conanda. Nota de Filosomídia