Aplicativos
infantis recolhem dados de crianças e não informam pais, diz estudo
Natasha Singer
Do "New
York Times"
Centenas
de aplicativos móveis para crianças não oferecem aos pais informações básicas
sobre as informações confidenciais que os programas recolhem e distribuem sobre
seus filhos, afirma um novo relatório federal norte-americano publicado na
segunda-feira (10).
Apenas 20% dos apps para
crianças oferecem informações transparentes sobre suas práticas de coleta de
dados, de acordo com um relatório preparado pela FTC (Comissão Federal do
Comércio) norte-americana e divulgado na segunda-feira. Os apps que oferecem
informações muitas vezes apresentam links para normas de privacidade densas,
longas e excessivamente técnicas, "repletas de informações
irrelevantes", de acordo com o relatório.
O estudo da FTC avaliou
as normas de privacidade de 400 apps infantis populares --metade dos quais
disponíveis na Apple App Store e a outra metade no Android Market, do Google--
e comparou as informações prestadas pelos apps com as políticas de coletas de
dados que eles efetivamente adotam.
"A maioria dos apps
não presta quaisquer informações sobre os dados recolhidos, muitos menos os
tipos de dados recolhidos, o propósito da coleta e quem teria acesso a
eles", afirma o estudo da FTC. "Ainda mais perturbador, os resultados
demonstram que muitos dos apps compartilham certas informações --como o número
de telefone de um aparelho, a sua localização exata ou seu código de
identificação exclusivo-- com terceiros, de acordo com o estudo.
Mais de metade dos apps
estudados transmite dados sobre crianças, muitas vezes diretamente a anunciantes.
Os pesquisadores também reportaram que a maioria dos apps não informa aos pais
a presença de recursos interativos como publicidade, compartilhamento em redes
sociais ou a possibilidade de que as crianças comprem produtos virtuais
diretamente do app. Por exemplo, apenas 9% dos apps revelam aos pais que
apresentam publicidade, mas os pesquisadores da FTC constataram que na
realidade 58% deles contêm anúncios. Além disso, dos 24 apps que afirmaram não
apresentar publicidade, dez na verdade continham anúncios, segundo o relatório.
O estudo aponta para o
fato de que algumas dessas práticas podem violar a proibição da FTC a práticas
desleais ou enganosas. Essas práticas também podem representar violação da lei
federal de proteção à privacidade da criança, conhecida como Lei Coppa, de
1998. A lei requer que os operadores de sites obtenham o consentimento dos pais
antes de recolher ou divulgar nomes, endereços ou outros dados pessoais de
crianças com menos de 13 anos.
As autoridades
regulatórias dizem que estão iniciando "numerosas investigações não
públicas" para determinar se as discrepâncias entre as revelações dos apps
quanto à coleta de dados e as práticas que eles efetivamente adotam representam
violação da lei.
O relatório é parte do
trabalho da FTC para fortalecer as normas de proteção à privacidade das
crianças on-line.
Nos últimos meses,
porém, algumas companhias de mídia importantes, bem como associações de
criadores de aplicativos e do setor publicitário, vêm pressionando a FTC a
atenuar as atualizações que ela propõe para a Lei Coppa. O momento de
divulgação do relatório sugere que a FTC pode estar tentando estabelecer as
bases para proteção mais vigorosa à privacidade das crianças nas redes.
A agência espera
atualizar as normas a fim de acompanhar os desdobramentos em apps móveis,
reconhecimento de voz, reconhecimento facial e práticas abrangentes de coleta
de dados por anunciantes. A agência propôs, por exemplo, uma lista mais longa
de dados sobre crianças que requereriam consentimento paterno para coleta:
fotos, gravações de voz e números de identificação exclusivos de aparelhos
móveis que possam ser usados para rastrear crianças e compilar informações
sobre elas em diversos aplicativos.
No relatório, as
autoridades regulatórias afirmam que sua preocupação era a de que os
anunciantes e empresas de coleta de dados usassem a informação obtida nos apps
infantis para desenvolver perfis detalhados de crianças sem o conhecimento ou
consentimento dos pais. Os defensores das crianças argumentam que perfis assim
detalhados poderiam constituir risco de segurança --dando a desconhecidos a
capacidade de localizar ou contatar uma criança--, bem como um risco de que a
criança sofra discriminação ou influência indevida da parte dos anunciantes.
"A transmissão de
informações sobre crianças a terceiros de forma invisível e sem o conhecimento
dos pais causa preocupação", afirma o relatório. Por exemplo,
pesquisadores da agência reportaram que 223 dos apps estudados transmitem dados
a pelo menos uma de 30 redes de publicidade, companhias de análise de dados ou
outras empresas externas --sem explicar por que essas organizações precisam
recolher esses dados sobre as crianças. A transmissão de dados a essas
empresas, afirma o relatório, ilustra o motivo para que "os pais precisem
de informações claras e precisas sobre privacidade em um lugar específico e de
fácil acesso".
Esse é o segundo estudo
da FTC sobre o ecossistema dos apps infantis, neste ano. Um relatório divulgado
em fevereiro revisava informações sobre coleta de dados às quais os pais tinham
acesso fácil nas lojas de aplicativos ou nos sites das empresas criadoras de
aplicativos, mas não envolveu teste comparativo entre as informações prestadas
e as práticas concretas das empresas.
Desde então, autoridades
regulatórias estaduais e federais fizeram diversos esforços para encorajar os
criadores de apps e empresas de coleta de dados a adotar práticas mais
transparentes. Kamala Harris, secretária da Justiça da Califórnia, por exemplo,
assinou neste ano um acordo com diversas das principais plataformas de
aplicativos para garantir que os apps oferecidos nelas apresentassem normas de
privacidade. Ela também enviou, recentemente, cartas a cem empresas cujos
aplicativos não se enquadravam às leis da Califórnia, que requer que postem
suas normas de privacidade, informou Harris. Na semana passada, ela abriu
processo contra a Delta Air Lines por não informar aos seus clientes que o app
Fly Delta recolhe informações confidenciais tais como nome completo, telefone,
endereço de e-mail, foto e localização do usuário.
A Administração Nacional
das Telecomunicações e Informação, parte do Departamento do Comércio
norte-americano, vem coordenando os esforços de grupos setoriais e de defesa do
consumidor que estão tentando estabelecer um código de transparência para as
práticas de coletas de dados dos apps móveis.
Mas o novo relatório da
FCT concluiu que não houve grande melhora para o usuário.
"A despeito de
muitos esforços de alta visibilidade para ampliar a transparência do mercado
móvel, o progresso foi pequeno ou nulo", o relatório afirma. "O setor
parece não ter feito grande progresso em melhorar sua transparência, desde o
primeiro relatório sobre apps infantis, e a nova pesquisa confirma que dados
continuam a ser revelados sem autorização em base frequente."
Os pesquisadores da
agência reportaram que quase 60% dos apps infantis estufados transmitem o
número de identidade do aparelho, em geral a uma rede publicitária ou outra
companhia externa. Mas apenas 20% dos aplicativos revelam essas práticas. Um
app mencionado no relatório "tem um sistema problemático de informação
quanto a normas de privacidade", afirma o estudo, por afirmar que não
compartilha dados com terceiros quando na verdade transmite o número de
telefone, localização exata e identidade do aparelho a diversas redes
publicitárias.
Talvez nem todos os pais
estejam preocupados com publicidade, coleta de dados, compartilhamento em redes
sociais ou a possibilidade de que aplicativos "gratuitos" permitam
que seus filhos gastem centenas de dólares comprando produtos virtuais. Mesmo
assim, afirma o relatório, os apps devem oferecer informações exatas sobre suas
práticas para permitir que os pais decidam se autorizarão seus filhos a
usá-los.
Tradução de Paulo
Migliacci
Reproduzido
de Folha
UOL
10
dez 2012
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