quarta-feira, 18 de março de 2015

Queremos ser normais ou bem comportados?


Queremos ser normais ou bem comportados?

Tivemos sorte por não ver visionários como Einstein, Newton e Beethoven em uma sala de aula. Com dificuldade de aprendizado, seriam transformados em bons alunos, diagnosticados e medicados

“Foco” é a palavra de ordem nas escolas e no mercado de trabalho. Para vencer na vida, a dispersão de atenção para outros interesses além das tarefas do dia a dia é não apenas mal vista: é diagnosticável como um transtorno mental passível de cura. De acordo com uma ala da psiquiatria, essa ideia de “transtorno” parte de duas premissas. Uma é semântica. Ela suaviza a ideia de “doença mental” e passa a ser usada como uma espécie de identidade psíquica por meio de nomenclaturas como “TOC”, “TDAH”, “hiperatividade”, “bipolaridade”, “ansiedade” e “transtornos de humor”.

A outra dita que, por trás da desordem, existe uma ordem. Nesta ordem, o estudante estuda e o trabalhador trabalha. Em nome dela nos medicamos. Cada vez mais e, segundo especialistas, sem que sejam levados em conta os impactos, para as crianças e suas famílias, do diagnóstico e da medicação.

Quem analisa os índices de tratamento à base de drogas psicoativas imagina que o planeta enfrenta hoje uma “epidemia” de transtornos mentais. Nos EUA, uma em cada 76 pessoas são hoje consideradas incapacitadas por algum tipo de transtorno – em 1987, este índice era de uma em cada 184 americanos. O número de casos registrados aumentou 35 vezes desde então.

Segundo o Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA, 46% da população se enquadrariam nos critérios de doenças estabelecidos pela Associação Americana de Psiquiatria. Tais diagnósticos criaram um mercado poderoso de medicamentos psicoativos – o que significa medicar tanto pacientes com crises agudas de ansiedade até crianças diagnosticada com grau leve de “hiperatividade” ou “espectro de autismo”, a chamada síndrome de Asperger. Essas crianças precisam manter o “foco” na sala de aula se quiserem ter alguma chance de passar no vestibular.

A pressão sobre elas em um mundo cada vez mais competitivo cria um consumidor fidelizado: a criança que hoje precisa de medicamento para se manter em alerta será, no futuro, o adulto dependente de medicamentos para dormir. Essa pressão, apontam estudos, tem origem na sala de aula, passa pela sala da direção, chega aos pais como advertência e desemboca na sala do psiquiatra, incumbido da missão de enquadrar o sujeito a uma vida sem desordem.

Mas como cada categoria de transtorno mental é construída e delimitada? Quais pressupostos fazem com que determinados comportamentos e/ou estados emocionais sejam considerados normais e outros, não? Quem definiu que uma criança com foco na sala de aula é normal e uma desconcentrada é anormal? Qual é, enfim, a “ordem” que a prática psiquiátrica visa a garantir?

Essas questões serão temas de debates em um ciclo de encontros do Café Filosófico CPFL, sob curadoria do professor livre-docente em Psicopatologia do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp Mário Eduardo Costa Pereira, a partir de 8 de agosto[1]. As palestras serão gravadas todas as sextas-feiras ao longo do mês, às 19h, e os interessados de todo o País podem acompanhar as gravações e enviar perguntas ao vivo pelo portal. Além de Costa Pereira, participam do módulo o psiquiatra infanto-juvenil e professor da Uerj Rossano Cabral Lima, o professor da Universidade da Califórnia Naomar Almeida Filho e o psiquiatra da infância e adolescência e consultor do Ministério da Saúde Fernando Ramos.

Se for esta a normalidade que tanto buscamos, o mundo teve sorte por não ver visionários como Bill Gates, Einstein, Newton e Beethoven em uma sala de aula nos dias atuais. Todos eles tinham dificuldade em socialização, comunicação e aprendizado. Sofriam, em algum grau, de espectro de autismo, e seriam facilmente transformados em bons alunos, diagnosticados, tratados e medicados. O mundo perderia quatro gênios, mas ganharia excelentes funcionários-padrão, contentes e domesticados.

Para tratar do tema o psicanalista Mário Eduardo Costa Pereira, da Unicamp, critica o uso do diagnóstico clínico na psiquiatria para tentar adaptar o sujeito a uma vida de regras pouco questionadas.

Abaixo a palestra completa na CPFL, gravado em 8 de agosto de 2014.

Reproduzido de Contioutra (05 mar 2015) via  Carta Capital (04 ago 2014)



[1] 2014

Para relembrar...

quinta-feira, 12 de março de 2015

“Toda criança começa como uma cientista nata, e então nós arrancamos isso delas”


“Toda criança começa como uma cientista nata, e então nós arrancamos isso delas” 

“Toda criança começa como uma cientista nata, e então nós arrancamos isso delas. Entre as características que ele valorizava em um cientista e em qualquer outra pessoa estão a curiosidade e a imaginação, traços típicos das crianças. Para o astrônomo, pensar cientificamente era algo como interrogar de forma metódica diversos aspectos da natureza, o que não deixa de ser uma forma de curiosidade aplicada. A respeito da imaginação, ele acreditava ser um dos motores fundamentais do conhecimento humano.”

Leia o texto completo, “12 reflexões que vão te introduzir ao pensamento de Carl Sagan”, na Revista Galileu, clicando aqui.

Conheça o Portal Carl Sagan (inglês), clicando aqui.

Leia também “Homens, Mulheres e "Crianças" no "pálido ponto azul" e assista ao vídeo “O Pálido Ponto Azul”, clicando aqui.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Dicionário feito por crianças revela um mundo que os adultos não enxergam mais

O professor Javier Naranjo e alguns de seus alunos

Dicionário feito por crianças revela um mundo que os adultos não enxergam mais

Na Feira do Livro de Bogotá, um dos maiores sucessos foi um livro chamado “Casa das estrelas: o universo contado pelas crianças”. Nele, há um dicionário com mais de 500 definições para 133 palavras, de A a Z, feitas por crianças.


O curioso deste “dicionário infantil” é como as crianças definem o mundo através daquilo que os adultos já não conseguem perceber. O autor do livro é o professor Javier Naranjo, que compilou informações durante dez anos durante as aulas. Ele conta que a idéia surgiu quando ele pediu aos seus alunos para definirem a palavra criança e uma das respostas que lhe chamou atenção foi: uma criança é um amigo que tem o cabelo curtinho, não toma rum e vai dormir cedo.


Veja outros verbetes do livro.

Adulto: Pessoa que em toda coisa que fala, fala primeiro dela mesma (Andrés Felipe Bedoya, 8 anos)

Ancião: É um homem que fica sentado o dia todo (Maryluz Arbeláez, 9 anos)

Água: Transparência que se pode tomar (Tatiana Ramírez, 7 anos)

Branco: O branco é uma cor que não pinta (Jonathan Ramírez, 11 anos)

Camponês: um camponês não tem casa, nem dinheiro. Somente seus filhos (Luis Alberto Ortiz, 8 anos)

Céu: De onde sai o dia (Duván Arnulfo Arango, 8 anos)

Colômbia: É uma partida de futebol (Diego Giraldo, 8 anos)

Dinheiro: Coisa de interesse para os outros com a qual se faz amigos e, sem ela, se faz inimigos (Ana María Noreña, 12 anos)

Deus: É o amor com cabelo grande e poderes (Ana Milena Hurtado, 5 anos)

Escuridão: É como o frescor da noite (Ana Cristina Henao, 8 anos)

Guerra: Gente que se mata por um pedaço de terra ou de paz (Juan Carlos Mejía, 11 anos)

Inveja: Atirar pedras nos amigos (Alejandro Tobón, 7 anos)

Igreja: Onde a pessoa vai perdoar Deus (Natalia Bueno, 7 anos)

Lua: É o que nos dá a noite (Leidy Johanna García, 8 anos)

Mãe: Mãe entende e depois vai dormir (Juan Alzate, 6 anos)

Paz: Quando a pessoa se perdoa (Juan Camilo Hurtado, 8 anos)

Sexo: É uma pessoa que se beija em cima da outra (Luisa Pates, 8 anos)

Solidão: Tristeza que dá na pessoa às vezes (Iván Darío López, 10 anos)

Tempo: Coisa que passa para lembrar (Jorge Armando, 8 anos)

Universo: Casa das estrelas (Carlos Gómez, 12 anos)

Violência: Parte ruim da paz (Sara Martínez, 7 anos)

Reproduzido adaptado de Repertorio Criativo
06 mar 2015