terça-feira, 10 de abril de 2012

Consume Hasta Morir


ConsumeHastaMorir: Quem somos?

ConsumeHastaMorir constitui uma reflexão sobre a sociedade de consumo em que vivemos, utilizando um de seus próprios instrumentos, a publicidade, para mostrar até que ponto se pode morrer consumindo.

Esse projeto nasce em Madrid no ano de 2002, dentro da associação Ecologistas em Ação, uma confederação de âmbito estatal que surge como fruto da unificação, em 1998, de mais de 300 grupos ecologistas. Desde então, mantemos a página web consumehastamorir.com, elaboramos material gráfico e audiovisual de contrapublicidade, escrevemos textos, damos oficinas ou participamos em processos de criação coletiva junto com outros coletivos sociais.

Um pouco da história

Enquanto o consumismo se estabelecia na classe média nos anos sessenta, um novo movimento artístico reagia contra o intelectualista expressionismo abstrato. A arte pop se propunha a recolher e reutilizar todos esses códigos e linguagens comerciais que a televisão, a rádio, a imprensa e os enormes painéis publicitários colocados ao ar livre utilizavam com êxito surpreendente. As linguagens, a comunicação, eram percebidos agora como um organismo complexo, e seu papel político e transformador recaía não só na mensagem ou em seu canal, mas também em novos e evocadores elementos como o signo comunicativo. São anos em que artistas e movimentos sociais realizam experimentações com espaços lúdico-reivindicativos e com a ideia de formas de expressão que não somente acompanhem as mudanças sociais, mas que também as provoquem.

Com o aumento do número de painéis publicitários e da publicidade estampada em pontos de ônibus, paradas de trem, e outros tipos similares,as intervenções contrapublicitárias se fazem mais comuns: a zoação dos jovens, o protesto de militantes sociais ou a estratégia de difusão massiva dos artistas grafiteiros... a publicidade se fazia onipresente, e seus chamativos suportes constituíam fachadas atrativas para diferentes tipos de expressão. Nos últimos anos da década de oitenta, os membros do BLF (a Frente de Libertação de Painéis Publicitários), munidos de macacões e escadas, se apresentam em plena luz do dia diante de um cartaz que mostrava anunciava um famoso cantor nova-iorquino. Taparam o texto do cartaz, colocando ao lado da imagem do cantor um balãozinho de história em quadrinho, feito com tinta das que se usa para pintar os quadros negros comumente vistos em escolas, umas caixas com giz, convidando os transeuntes que passavam por ali a expressar-se nesse quadro-negro improvisado: “O que estará pensando o conhecido cantor?” Em algumas horas, o BLF já havia fotografado dezenas de opiniões sobre a política, piadas, operações matemáticas e insultos que rompiam o clássico e unidirecional monólogo publicitário. Um diferente e multifacetado movimento de resposta ao discurso publicitário começava a tomar forma.

Com o passar dos anos, esse espaço situado entre a contracultura e um ativismo social renovado vai moldando-se em uma identidade própria, restrita não somente à crítica da sociedade de consumo e de suas formas de expressão. O BLF, o Reclaim the Streets, o Adbusters, o The Yes Man, o Cassers de Pub ou o Yomango são projetos que, vindos de diferentes partes do planeta, confluem na crítica ao papel ideológico da publicidade, mas que também mantém um compromisso com a experimentação linguística e a provocação expressiva. São projetos que debatem abertamente com o monólogo dos painéis, com a publicidade dos supermercados ou com os meios de comunicação de massa; apropriando-se, como anteriormente o fizera a arte pop, da linguagem que se ouve nas cidades, na televisão, nos spots publicitários. No entanto, toda essa dimensão linguística de nada serve sem uma bem fundamentada crítica à injusta distribuição dos recursos do planeta, e à espiral consumista que a sustenta. Não é por acaso que, ao mesmo tempo em que esse movimento contrapublicitário tomava corpo, acontecia o mesmo com outro movimento, heterogêneo, de resposta a esse modelo de superprodução e consumo: as associações de defesa dos direitos dos consumidores; o movimento pela agricultura ecológica; o direito sobre o como e do que alimentar-se e, finalmente, as redes de comércio justo e alternativo, que nasciam em muitos casos de outros movimentos sociais, mas centravam sua luta em torno a um novo sujeito social, o consumidor.

Dessa maneira, os coletivos envolvidos nessa reformulação do modelo de consumo contribuíram com a contrapublicidade, fornecendo-lhe uma base ideológica e uma maneira de atuar baseada no consumo responsável, no ecologismo e na desaceleração do consumo, sem os quais a contrapublicidade corre o risco de ficar reduzida a uma atividade artística de vanguarda. Como ferramenta crítica, a contrapublicidade denuncia o apelo neoliberal por um consumismo liberador e as dinâmicas de poder que as empresas anunciantes escondem sob uma imagem maquiada , sustentada por grandes investimentos econômicos. Essa crítica diz, portanto, o que os anúncios nunca dizem: o tipo de modelo produtivo e de consumo que está por detrás do anunciante e quais são suas repercussões ambientais e sociais.

A contrapublicidade também oferece uma aproximação educativa à linguagem do consumo, esse idioma que nos rodeia. Com o simples fato de enxergarmos um anúncio publicitário além de seu contexto habitual (30 segundos de estudada narrativa de símbolos, imagens e slogans) são expostas as diferentes estratégias comerciais que este enseja e os valores que dão forma à ideologia neoliberal, normalizadora e legitimadora desse modelo socioeconômico. Dessa maneira, a análise crítica dos anúncios funciona como uma ferramenta transversal na medida em que permite abordar temas tão diferentes como os que abordam a própria publicidade (relações de gênero, de poder, estereótipos de êxito social, exclusão e marginalização, sustentabilidade ambiental...) além de ser um método para aprofundar a análise das contradições do apelo sentimental, confrontando a veracidade da imagem que é oferecida ao consumidor.

Nesse contexto aparece ConsumeHastaMorir no ano de 2002, como uma ferramenta para analisar nossa sociedade de consumo, mas também para investigar como podemos difundir melhor o trabalho levado a cabo pela associação Ecologistas em Ação (Ecologistas en Acción) para fazer de nosso mundo um lugar mais sustentável e habitável.

E também ocorre que, longe de estarmos diante de um consumidor historicamente mais preparado, hoje estamos mais que nunca carentes de instrumentos que nos permitam estabelecer um limite preciso em meio a tanto estímulo e tão abrumadora densidade informativa. Aumentaram de forma imensa as falas, os discursos e os slogans, mas ainda assim seguimos carentes de um vocabulário, como dizia Baudrillard, que nos permita mover-nos entre um ciclo interminável de objetos de consumo programados para deixar de funcionar; e, acima de tudo, seguimos presos à lógica desse “progresso” tão irreal como o é o do consumo infinito ou as matérias-primas inesgotáveis, às custas da exploração de boa parte da humanidade e depois de comprovar que nossa felicidade depende de outras coisas. Dentro desse contexto, romper o monólogo do consumismo y trocar os slogans por perguntas bem direcionadas (Em que condições é feito esse produto? Que benefício nos traz seu consumo?...) supõe um exercício indispensável para um consumo minimamente crítico e responsável: até que ponto morremos de tanto consumir?

Tradução de Jarley Frieb

Reproduzido de Consume Hasta Morir

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