quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Sobre as desgraças: as nossas crianças detestam informação, notícias, actualidade e telejornais...


Sobre as desgraças

Inês Teotónio Pereira

Um dos meus filhos que é do Sporting, habituado portanto ao dissabores e às desilusões da vida, confessava-me que as únicas notícias que ele gosta de ver na televisão são as notícias sobre futebol.  Porque, e cito, “as notícias de futebol não falam de desgraças”. Isto dito por uma criança do Sporting, que nem sequer gosta muito de futebol, exige o dobro da atenção e é bastante revelador: as nossas crianças detestam informação, notícias, actualidade e telejornais. E percebe-se porquê.

É certo que a vida é difícil, que existem guerras a mais no mundo e que o ânimo foi de férias para parte incerta, mas também é verdade que as notícias deprimem ainda mais do que a realidade. E deprimem uma família inteira. As crianças não se esforçam para gostarem ou para se interessarem pelas coisas – elas gostam ou não gostam - por isso também não se esforçam para ver um telejornal. Acham tudo aquilo deprimente e voltam as costas ainda o apresentador não acabou de ler o primeiro parágrafo no teleponto.

Qualquer família que se reúna em volta de um qualquer telejornal é ao fim de meia hora uma autêntica bomba relógio de má disposição e representa um verdadeiro perigo para os seus membros, para a boa disposição nacional e até para a alegria familiar.

Ora, isto é um dilema para um pai ou para uma mãe que se queira manter toda a família informada e ao mesmo tempo preservar em casa um ambiente alegre. Impossível. A televisão, não deixa. Alegria, boa disposição e optimismo são absolutamente incompatíveis com qualquer telejornal português. E é por isso que os meus filhos confundem notícias com crise, realidade com depressão e jornalismo com drama.

A boa notícia é que as derrotas do Sporting já são, no fundo, boas notícias. Quanto ao resto, receio que estejamos a criar uma geração de iletrados noticiosos. Ou coisa parecida.

08 set 2011



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