sexta-feira, 1 de julho de 2011

Educar em meio à guerra


Diretor da ONG mexicana Investigação e Educação Popular Autogestiva defende que é necessário discutir a violência e ensinar as crianças a conviver com ela

A Investigação e Educação Popular Autogestiva é uma entidade mexicana que trabalha diretamente com governos e diferentes instâncias sociais para assegurar os direitos da população indígena e pobre localizada na zona sudeste do país. Sediada em Yucatán, a organização também tem projetos voltados para a primeira infância.

Em entrevista a seguir, concedida ao editor Rubem Barros, Guillermo Angulo, diretor do órgão e antropólogo, conta como se dá o trabalho com as crianças e jovens que estão ligados, direta ou indiretamente, ao problema do narcotráfico. Para ele, ao evidenciar a existência da violência, a escola pode desempenhar um papel fundamental no sentido de sanar o medo na sociedade. “Muitas vezes, a violência é ocultada ou maquiada, porque há a ideia de que as crianças não devem saber sobre ela”, afirma.

Formado em antropologia, o mexicano acredita que a escola deve gerar ações, para além da aprendizagem, que ofereçam alternativas aos alunos relacionadas com a colaboração. O diretor esteve em São Paulo por conta do Seminário Internacional de Educação Integral (29-30 mar 2011), realizado pela Fundação Itaú Social e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

(...) Muitos educadores preferem ocultar o tema da violência a trabalhar suas representações. Qual sua ideia a respeito?

Em primeiro lugar, deve-se evidenciar que a violência existe. Muitas vezes ela é ocultada ou maquiada, porque há a ideia de que as crianças não devem saber sobre ela. Um exemplo foi o incêndio de uma creche no México em que 49 crianças morreram e outras ficaram feridas. Três meses após o ocorrido, fomos à escola, perguntamos aos professores sobre o incêndio e ninguém queria falar sobre o assunto. Mas os alunos tinham problemas de reprovação, muitos deles haviam perdido irmãos, vizinhos, amigos. Os professores diziam: “já passou”. A tendência do adulto é pensar que o esquecimento resolve as coisas. É uma visão de subestimação, como se a criança não entendesse e apagasse o acontecimento. Ao contrário, isso vai se alimentando, e acaba tendo de ser tirado fora de alguma maneira. O importante, em primeiro lugar, é trazer o tema à mesa; segundo, colocá-lo em dimensões em que as crianças possam trabalhar com o ocorrido.

Quando trabalhamos nessa colônia, por exemplo, falar da morte e da perda com as crianças foi muito importante porque elas puderam se expressar. Encontramos desenhos impressionantes, como um de cruzes com fogo. Os alunos diziam que Deus provocou o incêndio porque queria levar as crianças. Todo o imaginário da criança está lá e se ele não se solta, isso permanece dentro deles. Temos de preparar os professores para que trabalhem esses temas, o que fará com que eles dêem à violência a dimensão correta, em vez de fazer simulações.

Se eles próprios não fazem as representações da violência, não permitiriam que as crianças o fizessem.

Claro, cada vez mais trocamos a liberdade pela segurança. Preferimos estar seguros e ficamos aqui; não saímos porque assim não nos vão fazer nada. Isso gera uma situação que, daqui a uns 20 anos, será terrível. Enlouqueceremos."

Leia a entrevista na página da Rede Nacional Primeira Infância, reproduzida do UOL clicando aqui.

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