sábado, 19 de fevereiro de 2011

A necessidade do contole público da televisão


"As ondas da televisão trafegam pelo espaço eletromagnético, um bem público, escasso e finito e suas mensagens chegam diretamente aos domicílios, dentro de um reduzido leque de alternativas oferecidas aos telespectadores dos canais abertos, a maioria absoluta da população brasileira. Daí a necessidade de ser regulado pelo Estado, com o objetivo de evitar privilégios.

É diferente dos jornais e revistas, veículos que se utilizam de canais privados para circular e são lidos a partir da vontade individual e espontânea dos cidadãos. A televisão não, além de trafegar por canais públicos, entra em nossa casa sem que possamos realizar qualquer escolha prévia. Elas operam como concessões públicas, outorgadas pelo Estado, em nome da sociedade. São concessões temporárias com 15 anos de duração, uma informação que é sonegada ao público por aqueles que tem o dever de informar, ou seja os próprios concessionários dos canais de televisão. Por isso, a maioria da população tende a acreditar que empresas como a Globo, SBT ou Record são donas do espaço e não empresas ocupantes eventuais. Como as empresas de ônibus que trafegam pelas vias públicas.

Algo tão claro, é obscurecido no Brasil. Uma das razões está no fato do rádio, e depois com mais ênfase a televisão, terem surgido de maneira geral como decorrência de empreedimentos jornalísticos já estabelecidos. Basta citar os dois exemplos mais significativos: o império Associado, de Assis Chateaubriand e as Organizações Globo, de Roberto Marinho. Tendo como base essa origem, as emissoras de rádio e televisão desses grupos passaram a escudar-se na liberdade de imprensa vigente para os jornais e revistas, com o intuito de evitar qualquer tipo de ação da sociedade sobre as programações dos meios eletrônicos. A simples outorga e renovação de concessões, que deveria se constituir num processo aberto e transparente, é algo realizado longe dos ôlhos da sociedade. Como a maior parte dela só se se informa pelo rádio e pela televisão, a obscuridade do processo torna-se quase absoluta.


Essa é a “caixa-preta” da televisão brasileira. A outorga das concessões cujos efeitos são sentidos por toda a sociedade é relizada de forma quase secreta. Em países de democracia mais consolidada que a nossa, o processo de escolha da empresa que vai operar um canal de televisão é realizado às claras, com ampla participação dos setores organizados da sociedade. 


(...) A criação do órgão regulador no Brasil deve ser acompanhada da promulgação de uma nova Lei de Comunicação Eletrônica de Massa capaz de ocupar o vazio legal existente hoje. A lei em vigor é de 1962, assinada pelo presidente João Goulart, sob forte pressão dos empresários do setor. Para se ter uma idéia dessa pressão, o projeto inicial sofreu 40 vetos do Executivo, derrubados posteriormente no plenário do Congresso. Ficou a lei que os concessionários queriam, com algumas modificações introduzidas pela ditadura, em l967, através de um decreto-lei.

Se o Código Brasileiro de Radiodifusão (nome dado à lei) já regulava pouco naquela época, hoje é letra morta. Basta pensar que naquele momento a televisão ainda era em preto-e-branco e o video-tape uma grande novidade, para falarmos da tecnologia. Do ponto de vista cultural, viviamos num país ainda fortemente agrário, com quase metade da população ainda morando no campo. Não havia surgido a mini-saia e nem a pílula anti-concepcional. Mas a lei continua a mesma quando estamos às portas da chegada da TV digital ao país, numa sociedade em que hábitos, costumes e valores passaram por grandes transformações. Quem tem uma lei que não dá conta de nada disso, não tem lei alguma. A TV no Brasil opera num vácuo legal, deixando que apenas os interesses políticos e comerciais dos beneficiados com concessões de canais determinem o que deve ou não ir ao ar.

Dai a necessidade urgente de uma nova legislação, moderna e democrática, capaz de incluir nas decisões sobre o papel social, político e cultural da televisão todos aqueles que dela se utilizam como cidadãos e não apenas os que dela se beneficiam como comerciantes".

Laurindo Lalo Leal Filho

III Seminário Internacional Latino-Americano de Pesquisa da Comunicação


Tema Central: “Democratizar a comunicação: uma tarefa pendente?”

12 a 14 de maio de 2005

Escola de Comunicações e Artes/USP

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